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A necessidade ética do pedido de desculpas IV

Até aqui, nesta série, foi mostrada a importância do pedido de desculpas, em todas e quaisquer circunstâncias, nas quais o semelhante foi ofendido; e, como exemplo de circunstância, foi exposta acusação falsa e pública, diante de Juizado Especial. Neste artigo, penúltimo da série, será relatada a audiência e, nela, como pode inocente se tornar vilão da história.

O dia amanheceu chuvoso e assim continuou, o que contribuiu para dificultar, ainda mais, o deslocamento do octogenário, na metade do percurso até alcançar o nonagésimo ano de vida, temporariamente acometido de ligeira deficiência de mobilidade. Contudo, trinta minutos antes da hora aprazada, o corretor de imóveis já estava acomodado na antessala da sala de audiências. Embora não lhe seja agradável a espera, prefere isso a ser considerado negligente, relapso, quanto a horários e comprimento de compromissos. Por ser o único no recinto e pouco o trânsito de pessoas, a espera lhe pareceu mais longa. Passava poucos minutos (surpresa) da hora fixada, quando uma das portas se abriu, dela saindo mulher ainda jovem, que convidou o profissional a entrar.

Ele esperava encontrar a autora, sua representante e, talvez, um representante da concessionária de energia. Ao contrário, somente ele, corretor, comparecera diante da que se apresentou como conciliadora. A conciliadora indagou do corretor se sabia o porquê da audiência e, obtendo resposta afirmativa, informou que ela se realizaria online. O corretor, então pensou com seus botões: – muito engraçado, autora de tudo e sua representante, residentes na comarca, não comparecem, pessoalmente, e eu, metido no rolo a contragosto, sou obrigado a me deslocar de outra comarca, em momento impróprio, além de outras dificuldades! – O corretor então se lembrou de que “Madame Y”, a autora, não queria a audiência. Demorou algum tempo a se estabelecer a conexão, mas ela se fez, e… lá estavam as duas dondocas, sem terem que olhar, olhos nos olhos, o “boi-de-piranha”!

A advogada da “Madame Y” questionou o fato de a concessionária de energia não ter feito se representar, o que para qualquer pessoa de bom discernimento era natural, pois sua posição no caso, como credora de faturas junto à “Madame Y”, era tranquila, líquida e certa. A mesma advocada questionou também o fato de não ver o advogado do corretor. Informada pela conciliadora de que ele se apresentara sem advogado, ela argumentou contra, insistindo que havia necessidade de advogado. Novamente o corretor pensou: – por que tem ela tanto interesse que eu tenha advogado, neste momento? – O corretor pensou e conciliadora titubeou diante da argumentação vinda do outro lado, – o senhor precisa de um advogado! – E o corretor contra-atacou: – estou informado de que advogado é opção minha; está no documento que recebi. – A conciliadora consultou o documento e confirmou, esclarecendo à advogada. Em seguida, a conciliadora, dirigindo-se ao corretor perguntou se podia começar. Obtida a confirmação ela explicou: – o senhor responderá, estritamente o que lhe for perguntado; não poderá fazer nenhum comentário – Aqui o corretor abestalhou-se: – hein? T’aí a treta! Que raios de defesa é essa? Que perguntas serão feitas? Quem as fará? “Madame Y”? a advogada? a conciliadora? As três? – Ele pensou isso e mais algumas coisas, porém não falou, porque se o fizesse poderia sair dali, diretamente, para um “curso de canário”! Concluindo seu pensamento, acrescentou: – mas elas “não contavam com minha astúcia!” – Assim pensando, retirou da pasta algumas folhas grampeadas e as entregou à conciliadora, dizendo: – trouxe minha defesa por escrito.

– A conciliadora, por sua vez, informou à parte do outro lado da tela, o que acabava de acontecer. Estabeleceu-se profundo silêncio, enquanto a serventuária da Justiça redigia a ata da audiência que, praticamente, se resumia em início e fim. O corretor, se pudesse, teria pagado para ver, de perto, a cara das duas oponentes. Na próxima semana, a conclusão do caso.

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