Por Nylton Gomes Batista
Estou de volta a aquela estranha viagem, na qual a paisagem descortinada, de dentro do ônibus, não era a mesma desta região, e, a estrada era secundária, faixa única, sem acostamento e pouquíssimo tráfego. O caso foi, aqui, relatado na edição 1621 de 28 de fevereiro último.
Confesso que, se mais jovem fosse, talvez não tivesse divulgado a estranha experiência, por precaução ante o prejulgamento, eivado de preconceitos que podem desviar uma vida de seu curso, levando-a a caminhos, nos quais o retorno pode ser mais difícil do que se imagina. Aos 85 anos, nada que pensem ou falem da nossa sanidade mental pode nos atingir; não há perigo de sermos preteridos numa vaga de emprego, não mais o perigo da perda do emprego sob suspeita de insanidade. O muito que podem dizer é que estamos gagás ou caducos, mas para quem sabe viver a velhice nem isso incomoda; “num tô nem aí!”.
Já disse, aqui, certa vez, que a única desvantagem da velhice é a perda das referências humanas. À medida que avançamos em idade, a grande maioria dos nossos amigos, companheiros e conhecidos da infância, da juventude, até da meia-idade vai se transferindo para o outro plano, e, aqui ficamos como peixes fora d’água. O bom é que, nesses casos, o peixe aprende respirar em terra firme!
Bem, voltemos ao caso da viagem insólita, explicando, primeiro, porque voltamos ao assunto. Quando relatei a experiência, expliquei que o fazia para induzir a descoberta de outros casos, pois, se aconteceu com uma pessoa, pode ter acontecido com outras que, por medo, guardam segredo. O fenômeno, ainda que raro, como parece, deve ser inerente à natureza humana e merece ser mais bem conhecido. Além do texto divulgado nesta coluna, relatei o caso a algumas pessoas, e, foi numa dessas conversas que outro caso veio à tona, no último fim de semana. Estava a contar a um casal amigo, quando os dois reagiram: – mas, caso parecido aconteceu com Fulano! – Dito isso, Fulano, um vizinho comercial, foi chamado a participar da conversa. Não identifico os personagens, porque não estou autorizado a fazê-lo; só posso dizer que são residentes em Cachoeira do Campo.
Fulano confirmou o acontecido. Segundo ele, deslocava-se de ônibus, para Itabirito, onde se encontraria com pessoa da família, em determinado ponto, previamente combinada, no centro comercial. Até Amarantina, tudo foi normal, mas a partir dali Fulano não reconheceu a paisagem por onde passava. Assim como eu, também ele não denotou estranheza ou chamou a atenção de alguém para o fenômeno. Sem saber o que acontecia, preocupou-se, sim, com a pessoa que o aguardava, para resolver questões de comum interesse. Segundo seu relato, nada do descortinada por onde o ônibus passava lembrava o que existe naquele trecho até Itabirito. Somente ao cruzar o ponto, onde havia uma cancela da ferrovia, já dentro da cidade, a paisagem real se restabeleceu.
Interessante observar que, mais rápido do que se esperava, outro caso se revelou e de forma quase espontânea, pois nenhuma das três pessoas sabia da minha experiência; não haviam lido e nem ouvido sobre o caso. Dado também interessante é proximidade dos dois casos, no tempo e no espaço; ambos são recentes, acontecidos na mesma região e mesma rodovia, além de envolverem pessoas conhecidas entre si. Outra coincidência curiosa: no meu caso, a paisagem real se restabeleceu após o ônibus passar sob o Viaduto do Funil, que sustenta uma ferrovia; no caso do Fulano, a paisagem restabeleceu-se após o ônibus cruzar o ponto onde já passou uma ferrovia.
O fenômeno suscita uma série de perguntas que, à luz do conhecimento de um leigo, ficam sem respostas, razão pela qual, logo após a primeira experiência, enviei cópia do relato publicado ao AFINAL O QUE SOMOS NÓS, canal do Youtube conduzido por um físico e um neurocirugião. Os vídeos, apresentados aos domingos, abordam, especificamente, casos de “Experiencias de Quase Morte” ou EQM, porém, à parte do programa, a equipe talvez possa explicar ou lançar uma luz sobre o fenômeno, uma vez que este, por sua natureza, se enquadra dentro da pergunta “afinal o que somos nós?”. Ironicamente, procuramos conhecer tudo o que há lá fora, enquanto continuamos como tremendos desconhecidos de nós e para nós mesmos!