Por Nylton Gomes Batista
Nas pequenas cidades do interior, onde o bulício é menor e a vida pulsa em ritmo menos estressante, algo singular tem ocorrido quanto ao comportamento dos animais. A atenção concentrada do observador registra cenas antes inimagináveis: cães de rua circulam sem temor e até buscam companhia humana; pequenos mamíferos silvestres como o mico-estrela e o esquilo buscam abrigo nos quintais, e, o canarinho age como se pintinho fosse.
O cachorro sem dono, personagem clássico das ruas brasileiras, sempre carregou consigo o fardo do medo e da desconfiança. Entre humanos, as novas gerações desconhecem a realidade do passado, mas algumas pessoas entre as mais velhas devem se lembrar de como o consumidor carregava a carne dos açougues e outros pontos de venda: pendurada na mão, por meio de um pedaço de embira ou outra corda qualquer. Completamente exposto à vista de todos, o produto chegava em casa, sem sobressaltos; cães de rua, em maior número naquela época, não ousavam, sequer, aproximar-se. Atualmente, se quisessem restabelecer aquele costume, a coisa seria complicada. Sem o medo portado por seus ancestrais, eles tentariam forçar o compartilhamento do alimento.
Essa transformação não se limita aos cães. Pequenos mamíferos silvestres, como o mico-estrela, outrora exclusivamente associado às matas, agora pode ser visto em bandos nos quintais das casas. Sua convivência quase à porta da cozinha não traz alarde, porém, sim, um sentimento de que humanos já não mais lhes parecem bichos-papões. Esquilos, que antes se moviam apenas nas árvores com agilidade e discrição, também descem ao solo dos quintais com tranquilidade, como se estivesse na floresta. E talvez a cena mais poética dessa nova relação entre humanos e animais se manifeste no comportamento dos canarinhos. Outrora vistos tão somente nos galhos de árvores, avessos à proximidade de humanos, canarinhos, hoje, ciscam aos pés de pessoas como se pintinhos fossem.
Diante desses e outros casos, pergunta-se pela causa ou causas. No primeiro instante, veem à nossa mente dois fatores, que podem ter contribuído para a aproximação dos animais: proibição da caça e ações legislativas de proteção e preservação das espécies.
Anteriormente, cães de rua eram escorraçados, maltratados e mortos impiedosamente, animais silvestres eram vítimas da caça predatória; matavam-se animais por recreação, pelo simples prazer de matar. Pássaros como o canarinho eram perseguidos e aprisionados em gaiolas; perdiam a liberdade para que cantassem exclusivamente para seu predador. Essas crueldades, infelizmente, ainda não foram extintas, mas, pelo menos, foram bastante reduzidas suficientemente para a reação positiva entre os animais.
Por fim, à parte de todas as ações levadas a efeito em prol dos animais, há que considerar a ascensão da mentalidade humana a nível mais alto. Aqui, há que ser feita uma observação quanto à ordem desses fatores, pois muitos consideram o melhoramento mental cono consequência das ações citadas. Ouso dizer que é o contrário; a nova mentalidade, sim, é que possibilitou e proporcionou a proibição da caça e o surgimento de leis protetivas e preservadoras em relação aos ditos irracionais. Embora muitos não admitam, a espécie humana tende para o bem e sua mentalidade está em ascensão discreta, porém, contínua. Se não fosse por isso, melhoramentos não haveria na sociedade humana e, muito menos, na interação com os animais. Devido a isso, surgiram as primeiras iniciativas que, paulatinamente se desenvolveram em prol dos animais. De um modo geral, boas iniciativas são tomadas por alguns poucos indivíduos que, a princípio, são criticados, rechaçados, combatidos, até que se perceba, em grupo maior, a validade da nova ideia, do novo pensar, ampliando assim o círculo original onde brotou a iniciativa. A partir daí surgem as leis e ações protetivas. O restante da população passa à aceitação mediante ações educativas.
As mudanças, observadas no comportamento dos animas, mostram que a pretensa superioridade humana sobre eles não precisa, não pode e não deve estar baseada na imposição de qualquer tipo de sofrimento. Antes de tudo, assim como deveria ser entre humanos, o que deve prevalecer é o respeito.