Mauro Werkema
Instalado na antiga Casa de Câmara e Cadeia de Vila Rica (Ouro Preto), um dos mais belos exemplares da arquitetura colonial brasileira, o Museu da Inconfidência completa 80 anos. Na Praça Tiradentes, famosa em todo o mundo, em articulação monumental com o Monumento a Tiradentes, se impõe pela sua monumentalidade. Inaugurado em 11de agosto de 1944, bicentenário do nascimento do inconfidente e poeta Tomás Antônio Gonzaga, abriga os restos mortais dos conspiradores mineiros de 1789, levante precursor da Independência Brasileira de 1822. E exibe peças alusivas à vida e cultura mineiras do século XVIII, mobiliário, esculturas e pinturas, em coleções de extraordinário valor histórico, pedagógico e patrimonial de Minas Gerais e do Brasil.
Sua história começa em 1934 quando Getúlio Vargas acolhe sugestão do escritor mineiro Augusto de Lima de repatriar restos mortais dos inconfidentes mineiros degredados para a África. Em 1938, em Ouro Preto, Getúlio reivindica o prédio já desocupado pela inauguração da Penitenciária Agrícola de Neves, recebe as relíquias devolvidas a Minas Gerais e assina o Decreto-Lei 965, ainda em 1938, criando um Panteão dos Inconfidentes e um museu destinado à documentação e pesquisa da conjuração de 1789. Só quatro anos depois de abrigadas na Igreja de N.S. da Conceição de Antônio Dias, tempo para restaurações adaptativas do antigo prédio, coordenadas pelo IPHAN, criado em 1937, é que foi inaugurado o Panteão, em 1942, dois anos antes da inauguração do Museu da Inconfidência, reunidos os acervos alusivos à museologia.
O plano expográfico foi elaborado por Luís Camilo de Oliveira, intelectual e historiador mineiro, e pelo decorador suíço Georges Simoni. Ao lado das lápides dos inconfidentes são lembradas as personagens femininas da Inconfidência, homenageadas por seu enredo de paixão e desventura, ao lado dos revoltosos, intelectuais e políticos, que já falavam em independência e república, a exemplo da Revolução Francesa, também de 1789, e a Independência americana de 1774. Entre eles, o alferes de Cavalaria, Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, Protomártir da Independência Brasileira, enforcado no Rio a 21 de abril de 1792, em ato público, quando tinha 46 anos.
O Museu, é significativo lembrar, expressava também o ideal modernista liderado por Mário de Andrade, que via no século XVII mineiro e o extraordinário acervo cultural e artístico que produziu, uma autonomia cultural liberta dos cânones europeus. Gustavo Capanema, ministro da Educação de Getúlio após 1934, seu chefe de gabinete, Carlos Drummond de Andrade, Rodrigo Melo Franco de Andrade, diretor do IPHAN, todos mineiros, são personagens ilustres do Movimento Modernista, entre muitos outros da intelectualidade da época, e integram-se nesta missão de dar ao século dezoito mineiro expressão cultural e artística própria.
Na história do Museu da Inconfidência merecem lembrança e homenagem o arcebispo de Mariana, dom Helvécio Gomes de Oliveira, doador de valiosas peças, imagens e peças religiosas. Getúlio Vargas, que mandou vir do Rio a forca que supliciou Tiradentes e o 7º volume dos Autos da Devassa da Inconfidência Mineira. E também Vicente Raccioppi, ouropretano, colecionador de peças raras dos séculos XVIII e XIX . Várias outras coleções, ao longo do tempo, foram incorporadas. Entre os seus diretores merecem lembrança o cônego Raimundo Trindade, primeiro diretor, historiador da Arquidiocese de Mariana, o museólogo
Orlandino Seitas Fernandes, Delso Renault e, por longo período, o escritor mineiro Rui Mourão, a quem o Museu deve muitas realizações.
Hoje, ligado ao Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), o Museu da Inconfidência, sob direção de Alex Calheiros, procura atualização museológica e conceitual, com aprofundamento das pesquisas sobre o Ciclo do Ouro Mineiro, novas visões e incorporações às exposições, em cumprimento à sua missão de revelar a vida mineira no século XVIII, o legado dos inconfidentes e também a participação de novos agrupamentos sociais na vida mineira e suas épocas.
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