Em setembro de 2019, logo após os desastres de Mariana e de Brumadinho, o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) publicou uma histórica e marcante carta-compromisso das empresas mineradoras com relação aos cuidados ambientais e operacionais. O documento, elaborado após reuniões longas, com presença de duas centenas de executivos das mineradoras, e não só do minério de ferro, foi saudado com otimismo pelos municípios mineradores, pela imprensa e governos e pelo próprio setor. Trazia afirmações até ousadas, propondo “práticas inovadoras” para gestão das minerações, nos múltiplos aspectos desta atividade e seus impactos mas, e especialmente, adoção de novas tecnologias para gestão dos rejeitos e dos resíduos resultantes da mineração na purificação do material extraído do solo, entre outras resultantes.
Hoje, pouco mais de dois anos após a carta-compromisso, seria importante, como iniciativa das próprias mineradoras, com participação de outras instituições que tem interfaces com o setor, inclusive regulatórios e fiscalizadores, uma revisão. O setor cuidou efetivamente de aplicar as inovações e mudanças preconizadas? É certo que ocorreram mudanças de condutas, especialmente quanto ao meio ambiente e o cuidado com as barragens ameaçadoras. Mas os órgãos de controle continuam, diariamente, apontando que maiores intervenções ainda estão por serem realizadas no sentido de oferecerem às regiões e municípios maior segurança contra possíveis novos desastres.
Com as intensas chuvas deste ano os temores de muitas comunidades retornaram. E discute-se o destino, assim como a segurança, de pelo menos 30 grandes barragens de rejeitos existentes no Quadrilátero Ferrífero de Minas Gerais, onde se encontram as maiores reservas de minério de ferro do mundo. E que a cada dia atraem mais mineradoras. Hoje, tramitam nos pedidos de licenciamento para mineração solicitações para a Serra da Moeda, Serra da Piedade, região do Gandarela, extensões da Serra do Curral, Serra do Cipó, Norte de Minas e em grande extensão da Serra do Espinhaço, que atravessa toda Minas Gerais e tem esse nome justamente porque se assemelhra a uma “espinha dorsal” do Estado. Ferrífera e aurífera, é objeto de cobiça de empreendimentos internacionais.
Afinal, o setor evoluiu em níveis satisfatórios a partir dos termos da carta-compromisso de 2019? Há segurança plena nas barragens? O impacto ambiental está reduzido e é objeto de maior cuidado? Há reaproveitamento de terras mineradas, tornadas estéreis e devastadas? Cuida-se, nos novos projetos, da preservação dos mananciais e cursos d’água? E o relacionamento com as comunidades, conforme prometido, que deveria ir além da prestação mensal da contribuição financeira aos municípios mineradores, hoje em3,5% do lucro bruto, de grande ajuda para os municípios?
Minas nasce e tem seu nome devido à mineração. E todos sabemos da sua importância no mundo contemporâneo. Minas tem rico e diversificado subsolo, do ouro que beneficiou portugueses e ingleses, ao minério de ferro, que tem mercado internacional expandido e preços altamente vantajosos, acima de U$ 150 dólares a tonelada. E o Estado não recebe o imposto pela exportação, desde a extinção da famosa Lei Kandir.
É unânime a opinião de que Minas Gerais deveria receber mais por sua principal riqueza, o solo mineral. Poderia, enfim, desde a exploração espoliativa do século XVIII, já ter atingido um estágo maior de desenvolvimento econômico. Os municípios mineradores, em geral, continuem pobres e carentes, apesar do seu subsolo rico e de algumas devastações ambientais.
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