Por Nylton Gomes Batista
Há dois anos, no início da pandemia, poucas não foram, de muitas fontes, as previsões sobre o que seria o mundo, como viveria a humanidade, depois de passado o flagelo. Ainda que não tenha de todo passado, de fato, as mudanças já ocorrem, embora nem todos, de alguma forma, as percebam ou tenham dela consciência. Nos estudos, no trabalho, no empreendedorismo, nas relações sociais, na cultura, enfim, em todos os setores e atividades, alguma transformação ocorreu ou ocorre. Talvez não sejam muito afetadas, na pós pandemia, as duas extremidades da vida: crianças em idade não escolar e anciãos inativos.
Diante das adversidades decorrentes da pandemia, muitos devem ter aprendido a pensar, mudado o comportamento diante da vida, melhorado seu relacionamento com o próximo, numa espécie de compensação por tanto sofrimento e tantas vidas que se foram. Contudo, mudanças ainda virão, de acordo com sinais já detectados e podem não ser muito boas, a depender da óptica de cada um.
Como consequência da pandemia, agora agravada pela guerra na Ucrânia (não “da Ucrânia”), começa a faltar alimentos em alguns países, ativando o alarme do desabastecimento num mundo em que a população cresce em progressão geométrica e produção de alimentos, em progressão aritmética. A diferença é crescente, preocupante e, sabendo-se que, em termos políticos, soluções podem vir de acordo com a “lei do menor esforço”, há que, entre nós outros, estar de antenas ligadas, pois podem cobrar dos justos o que devem pecadores.
Estudos sobre alimentos artificiais, que se faziam “na moita”, estão se escancarando e entre as novidades, não para agora, mas para futuro não mui distante até proteína animal poderá vir de laboratórios. O bife não mais será do boizinho, engordado a capim, no pasto ou em confinamento, porém do filé gerado “in vitro” mediante manipulação especializada. Eram, até não há muitos anos, consideradas ideias futurísticas ou coisa de ficção científica. Antes desses laboratórios, no entanto, vêm as fazendas verticais, que são também verdadeiros laboratórios para produzir vegetais comestíveis de forma não convencional, em recintos fechados. Na verdade, elas já existem em algumas cidades do mundo, incluindo-se São Paulo, que produzem verduras e legumes, mas o cidadão comum ainda as desconhece, pois têm produção limitada, voltada para restaurantes classe “A” e, talvez clientes Vip.
Ainda não, mas tais empreendimento poderão concorrer com a agricultura natural e, quiçá, colocá-la em risco, mediante manipulação a partir de interesses econômicos e inescrupulosos. É verdade que a crise de desabastecimento dará espaço a uma e outra forma de produção agrícola, mas há os que sempre querem mais e, quanto a isso há que ter muita atenção para detectar suspeitas e saber discernir os reais propósitos por trás de cada ideia, por trás de cada projeto.
O Brasil, como líder na produção de alimentos, deverá expandir sua participação no fornecimento ao mundo, acrescentando às razões econômicas a questão humanitária, como compensação à insuficiência verificada em muitos países. Em razão dessa ascensão forçada na exportação, os preços poderão chegar a níveis insuportáveis, mas no Brasil há a força da agricultura familiar que, devidamente amparada, pode ser o fiel da balança entre a exportação e as necessidades internas. Associe-se à agricultura familiar outra modalidade, um tanto esquecida, mas que merece ser revitalizada como meio de garantir alimentos saudáveis e mais baratos: a agricultura domiciliar, ou seja, o cultivo dos quintais, por pequenos que sejam. Nessa modalidade, cada quadrado de terra deve ser aproveitado nem que seja com o plantio de um pé de couve ou moitinha de cebolinha! Até para quem mora em apartamento existem, hoje, técnicas e recursos para o cultivo de hortaliças! Dessa forma, o Brasil garantirá sua segurança alimentar sem deixar de contribuir para que o mundo também se alimente.
Contudo, para que a agricultura domiciliar prospere, a Lei tem que pesar sobre os “lalaus”, os vagabundos, invasores de quintais e sugadores do trabalho de terceiros, pois são eles a causa de muitas áreas não mais serem cultivadas. Roubam para vender e são tratados como “coitadinhos”; uma grande injustiça que precisa ser corrigida, antes que outras forças ocupem o lugar das famílias na produção de alimentos.