Nylton Gomes Batista
Veja-se o lado oposto de tudo que se vê, que se ouve, que se sente, sabendo-se da dualidade existente no mundo material. Se não fosse a imbecilidade do condutor bronco, ao volante daquele caminhão, este cantinho do jornal não estaria sendo preenchido com recordações, em comparação com a atualidade; registro e conhecimento do passado, para que melhor se realize o presente e se prepare o futuro. No fundo, no fundo, de alguma forma, a atitude do condutor mal-educado teve seu lado bom; serviu de gancho para a produção deste conteúdo!
Embora muito ainda tenha que ser conquistado e muito ainda tenha que ser melhorado, reconhecendo-se a eterna insatisfação humana diante da realidade, há que também reconhecer a evolução e o desenvolvimento processados ao longo dos últimos oitenta, noventa, cem anos vividos. Observe-se que o foco se restringe à qualidade da mobilidade humana, naquela época, consideradas as condições precárias das vias e dos meios disponíveis.
Ao se iniciar a transição entre o tropeirismo e o transporte mecanizado, o distrito de Cachoeira do Campo foi beneficiado com a passagem da primeira ferrovia brasileira, porém em seu extremo sul, cerca de quatorze quilômetros distante da sede distrital, a vila de Cachoeira do Campo. Para o cachoeirense viajar de trem, havia que caminhar pelo mato ou trilha, facilitado o deslocamento, se montado em animal próprio ou alugado. A situação só começou a melhorar nos anos 20, quando se abriu a estradinha Ouro Preto/Belo Horizonte, valendo-se do traçado da ferrovia. E o desvio da primitiva estrada de automóvel a beneficiar Cachoeira e Amarantina, não se deu pelos “belos olhos” dessas duas localidades, porém graças à influência dos padres salesianos, das Escolas Dom Bosco, que muito dependiam da ferrovia, para o deslocamento entre aquele estabelecimento e todo o país. Houvera, anteriormente, uma tentativa de se conseguir extensão de ramal da ferrovia, desde a estação Dom Bosco até Cachoeira, com o objetivo de atender às necessidades do estabelecimento a ser instalado no antigo Quartel dos Dragões, conforme esclarece a Lei nº 111 de 24 de julho de 1894, quando Ouro Preto ainda era capital do estado. Entretanto, a lei ficou no papel, convertendo-se na primeira grande frustração imposta aos cachoeirenses pelo recém-implantado regime republicano.
Bom tempo se passou, desde então, até a abertura da primitiva estrada de rodagem. Foi mais um benefício indireto, proporcionado pela presença salesiana em Cachoeira, pouco lembrado pelos críticos na recente contenda, após fechamento do estabelecimento. E se não fossem os salesianos, Cachoeira do Campo teria vivido ostracismo maior, a partir da mudança da capital para Belo Horizonte, deixando a cidade de Ouro Preto, “de cuecas”, praticamente abandonada, restando-lhe suporte de apenas a Escola de Minas, a Escola de Farmácia e uma unidade do Exército, instituições que, por serem federais, não foram levadas pelo governo estadual. Imagine-se a situação do interior do município.
As ruas de Cachoeira do Campo, por exemplo, só eram roçadas de dois em dois anos, por ocasião da Semana Santa, cujas solenidades também eram celebradas de dois em dois anos, devido ao seu alto custo. A frente da casa era limpa pelo morador, mas o restante virava floresta. Ultrapassadas essas carências, ruas foram calçadas, ainda que a desejar melhoras, limpeza urbana se implantou e o lixo passou a ser recolhido, mas tal qual na horta, no lugar do matinho inocente arrancado pode surgir a temida tiririca, outros obstáculos, outros inconvenientes surgiram no caminho dos pedestres. Como exemplo, citem-se estabelecimentos que, necessitados de áreas para carga/descarga e estacionamento para clientes, as têm totalmente sobre a faixa de pedestres. Ah! isso é por força da necessidade, é o comércio que se expande, é o progresso – dirão alguns. Se, para a expansão do comércio, o consumidor tem que se arriscar ao atropelamento, há alguma coisa errada necessitada de correção e não tem recebido a devida atenção. O primeiro olhar, o primeiro cuidado deve, sempre, se voltar para pessoa humana! Mas, parece que esse princípio moral caiu por terra, e, é por isso que, em Cachoeira do Campo, já existe até botequim de esquina instalado na calçada!
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