Por Nylton Gomes Batista
Popularmente denominada Rua de Baixo pelos primeiros cachoeirenses, à falta de um nome oficial, a Rua Santo Antônio pode mesmo ter surgido, espontaneamente, como trajeto preferido pelos que atravessavam a localidade, tocando boiadas ou tropas de burros, o único de meio de transporte terrestre à longa distância, para mercadorias, àquela época. Para o transporte local havia o carro-de-bois e a carroça. Ela, certamente, deve ter sido a segunda rua, surgida após a Rua de Cima. Como se pode deduzir, estava destinada, desde o início, à função de unir extremos geográficos locais, facilitar a circulação de pessoas e mercadorias, além de por ela se alcançarem as localidades mais próximas à leste, ou seja, Casa Branca (hoje Glaura) e São Bartolomeu.
A Rua Santo Antônio, ladeira um tanto longa, apresentava também outra característica muito interessante que, infelizmente, não pôde ser preservada na era do automóvel, sem prejuízos para seus moradores e lojas comerciais nela estabelecidas. Era algo inusitado, pois, pelo menos este autor não tem conhecimento de nenhuma localidade, onde alguma ladeira apresentasse a mesma característica ou recurso técnico, que a torvava singular. Mesmo em Cachoeira, além de duas ruas, que lhe eram confluentes, em outras ladeiras não se aplicou o mesmo recurso técnico.
Até 1972, quando se iniciou a urbanização de Cachoeira do Campo, a Rua Santo Antônio era toda escalonada, dotada de degraus, de altura e extensão variáveis e cerca de trinta graus de inclinação, construídos em determinados pontos do trajeto. O primeiro e grande degrau ficava localizado junto à esquina com a antiga Rua Fonte Fora (Rua J. Avelino Murta); era dos mais altos e extensos. Logo a seguir, na esquina com a Praça Santo Antônio, estava localizado um menor, e, quase defronte à capela, estava situado outro, mais ou menos, do mesmo tamanho do anterior. Alguns metros acima, alçava-se outro, talvez do mesmo porte do primeiro, seguido de mais dois pequenos até a esquina com a Rua das Mercês. Da esquina com a Rua das Mercês até alguns metros acima do ponto, onde se localiza a Rua do Ouro, havia outro grande degrau; e esse era o mais danificado entre os grandes, que sempre apresentaram avarias. Acima desse ficava o último dos grandes, talvez o maior, seguido de mais dois pequenos até a confluência com a Rua de Cima, onde hoje termina a Rua 7 de Setembro e se inicia a Rua Tombadouro. Descendo a mesma rua, canto direito, junto ao último dos grandes degraus, havia uma canaleta em V com cerca de um metro de largura, numa extensão de, mais ou menos, dez metros. Era feita de pedras menores, dispostas e afixadas de tal forma que resistiram a todas enxurradas, que por ali correram. Tudo indicava que a canaleta teria sido estendida a toda a rua, mas por algum motivo sua construção foi suspensa. Também a Rua das Mercês e rua a ligar a Praça Santo Antônio à Rua Padre Afonso de Lemos eram dotadas de degraus, embora esta última não fosse propriamente uma ladeira, ao contrário da Rua das Mercês. Os degraus na Rua das Mercês ainda estavam em perfeitas condições, por ocasião de seu desmonte, ao contrário dos situados na Rua Santo Antônio. Explica-se essa diferença pelo fato de a Rua das Mercês, ao longo do tempo, não ter sido utilizada pelo tráfego de animais e de veículos de tração animal. Não se sabe quando teriam sido construídos tais degraus, mas eram considerados muito antigos, talvez ainda do período colonial. Contudo, não se via neles sinal sequer de qualquer intervenção em caráter de manutenção; uns se preservaram, naturalmente, até o dia do seu desmonte; outros, avariados, avariados também chegaram ao fim. Presume-se que as calçadas, ou degraus, tenham sido construídas com a finalidade de atender duas necessidades. A primeira seria a suavização da aclividade, conseguida por trechos mais planos entre dois degraus; a segunda necessidade seria a redução da ação nefasta das enxurradas sob a forma de erosão. Quanto à segunda necessidade, até hoje, pode-se constatar o grande volume das enxurradas, ainda que se disponha de rede pluvial, o que não havia àquela época. Enxurrada vinda do Tombadouro tem como caminho natural a Rua Santo Antônio; talvez, por isso se tenha iniciado construção da mencionada canaleta.
Embora de vital importância, desde seu surgimento, a Rua Santo Antônio foi preterida, em parte, quando, em dezembro de 1928, inaugurou-se o serviço local de energia elétrica, sob os auspícios da Companhia Força e Luz Cachoeirense. O trecho, compreendido entre a esquina com a Rua das Mercês até o final, ficou sem iluminação pública, devido ao de fato de haver uma só casa, ao longo de grande extensão, até o final onde havia mais uma uou duas construções. Por essa razão, a Rua Santo Antônio, até a implantação do serviço CEMIG, foi via de trânsito unicamente diurno, devido à escuridão e matagal, que prevaleciam no seu final.