Por Nylton Gomes Batista
Recentemente, de autoria de profissional da área da psiquiatria, li texto sobre a felicidade, cantada e decantada, em prosa e verso, bem como buscada de diversas formas por uns e outros. Segundo tal profissional, há uma tendência individual de se valorizar o que lhe falta; e a felicidade é justamente a satisfação pela conquista do objeto ou condição faltante. Assim, quase em unanimidade, o ser humano tem a felicidade como a conquista daquilo que busca, que persegue no mundo. Ele cita dois filósofos, entre os antigos gregos. Aristóteles teria dito que a felicidade é um estilo de vida; em outras palavras, é preciso cultivar o que se tem de bom, para atingir a felicidade. De acordo Epicuro, o equilíbrio e a temperança dariam origem à felicidade, estado de ânimo que se traduz em sentimento de satisfação. Resumindo suas palavras, a felicidade é um estado de satisfação, equilíbrio físico, psíquico e sensação de bem-estar emocional.
Que me perdoem o moderno psiquiatra e os filósofos gregos, Aristóteles e Epicuro, se ouso contestar-lhes as palavras nesse assunto, o que não significa deixar de reconhecer seu elevado pensamento e consequente contribuição à evolução mental da humanidade. Se, no passado, a partir de grandes pensadores, confundiu-se o ser humano na conceituação do que seja felicidade, muito mais se confunde, agora, quando as necessidades naturais são extrapoladas, mediante acréscimo e supervalorização das artificiais, ou seja, criadas pelo próprio indivíduo, ao adotar a falsa ideia de que não pode viver sem estas últimas. Na era do consumismo exacerbado, cria-se a ideia, compartilhada por grande maioria de indivíduos, de que felicidade é ter saúde, amor a dois, bastante dinheiro e sucesso na vida.
Interessante é que exemplos a contrariar essa teoria são vistos em qualquer tempo e lugar, mas, longe de as pessoas se conscientizarem sobre a falácia da felicidade construída sobre bens materiais. Elas ainda correm e se arriscam pelo dispensável, pelo supérfluo, pelo situado além de sua realidade; e, pior, induzidas por interesses estranhos. A felicidade é algo muito além do percebido pelos nossos cinco sentidos e da nossa satisfação por conquistas intelectuais ou de poder, seja de natureza política ou econômico-financeira. A felicidade não está no TER, mas, no SER; também não o “ser”, cuja imagem se volta para o mundo e por este visto e qualificado, segundo as múltiplas tendências humanas.
Esse SER é a verdadeira essência do indivíduo, que este bem conhece, mas nem sempre é sentida ou percebida por outrem. É nesse SER que pode estar a felicidade do indivíduo. A felicidade também não é temporária, presente num momento e noutro, não, mas pode estar presente deste o nascimento ou adquirida, mediante mudança de comportamento perante a vida; uma vez adquirida, perdura para sempre.
Sob o impacto da pandemia COVID-a9, provocada pelo novo coronavírus poderão questionar: – Ah! mas e o sofrimento, especialmente o de agora? – Se o sofrimento, em qualquer grau fosse obstáculo à felicidade, esta então não existiria! O sofrimento, se não a todos os seres vivos, é inerente ao ser humano!
Ninguém dele escapa, pois é condição do plano físico. Em sendo faculdade da alma, a felicidade vem do interior do próprio indivíduo, não obstante dores e obstáculos de natureza externa, aos quais ele pode se adaptar, sem prejuízo de seu estado interior. Não importa o que digam sobre si ou que tentem fazer ruir o mundo à sua volta; sua capacidade de superação se reforça a cada momento, mediante a tranquilidade reinante em sua consciência. Se injustiçado, ele considera isso um mal menor que a injustiça cometido por si próprio, pois sabe que tudo que provém do seu interior volta à origem, assim como a água que cai como chuva ainda retornará ao céu como nuvem.
Felicidade é estado de espírito, estabelecido por consciência tranquila, onde não medra nenhum sentimento negativo voltado à manifestação da vida, sobretudo a humana. Nesse estado de espírito não se inclui mágoa, rancor, raiva, ódio, ainda que se conte com inimigos, em relação aos quais o desligamento deve ser preservado. No estado de felicidade, que nunca se preocupe em TER amigos(as), porém, sim, SER sempre amigo(a), em quaisquer circunstâncias.