O cidadão está a cuidar de suas coisas, no ambiente doméstico, quando o telefone toca e, atendido, do outro lado, uma voz se identifica como a de um fiscal. O munícipe se põe de sobreaviso, liga o sinal de alerta, pois em se tratando da prefeitura, já teve dissabores de sobra, entre os quais a cobrança de impostos já quitados e devidamente provados, além de processo interno, à revelia, acusado de fraudar recibo referente a IPTU, pago por internet banking. Num piscar de olhos, põe a cachola a repassar suas últimas atividades, que pudessem ter melindrado os “hômi”: não tem nenhuma obra em andamento, não joga lixo na rua, nem em cursos d’água. Embora, em vários pontos da localidade haja focos de fumaça, a denunciar verdadeiros “fogos eternos”, tal a constância do fato, aquele cidadão nada queima no quintal, mesmo sabendo que o nefasto procedimento não é fiscalizado e, muito menos, penalizado pelos “hômi” da prefeitura; é uma questão de princípios, de consciência e respeito aos semelhantes.
Naquele rápido exame de consciência, nada detectou de falta contra a santa administração municipal. Do outro lado, o dito fiscal continua, mais ou menos nestes termos: – recebemos a denúncia de que um lote, no endereço tal, está tomado por mato e de lá tem saído bichos, além de haver o perigo da dengue. O senhor confirma que lá existe mato? // – Mesmo sem olhar, confirmo, pois ainda estamos sob ação de chuvas, embora seu período haja se encerrado; enquanto ainda chove, a capina é como enxugar gelo. Espera-se, portanto, que o sol se firme. Quanto à alegada dengue, lá não há água e nem condições para tê-la empoçada – responde o interpelado. // – Será feita uma inspeção e poderá haver multa mediante notificação. // O cidadão chamado às favas ainda argumenta em contrário, lembrando que em muitos aspectos, questões mais sérias, a fiscalização é inoperante e abusos de toda a sorte são cometidos. O fiscal encerra a conversa afirmando que cabe a ele tão somente a questão do mato no lote.
O que ele chama de lote, na verdade, é um terreno de maiores dimensões, todo cercado por muro de quase dois metros de altura, o que impossibilita ser “fiscalizado” de fora. Mas, se o “hômi” diz ter recebido denúncia, deduz-se que não se trata de ação fiscalizatória, porém resposta à alguma língua grande e quente, que não se cansa de bater nos dentes contra semelhantes. Na prática, ele não é fiscal daqueles que correm atrás dos fatos contrários às regras, apenas ouvidor que, detrás de uma mesa, ouve o que lhe contam por meio do “disque-fofoca” municipal. Do outro lado da rua do terreno em questão, há um lote vago todo aberto e tomado por mato, mas seu proprietário não foi alvo de denúncia e nem recebeu reprimenda ou ameaça de multa por parte do dito fiscal. Confirma-se o que diz o povo: pau que bate em Chico não bate em Francisco! Também é bom esclarecer que o dito mato intramuros, é constituído, em parte, por capim brachiaria, e parte, por arvoredo natural, incluindo-se espécimes frutíferos, não havendo mato no verdadeiro sentido da palavra. O capim é alimento para animais e o arvoredo compensa, em parte, o que falta nas ruas da localidade, para ajuda na melhora do ar.
Nada contra o tal fiscal que, se não produz trabalho efetivamente apropriado e justo, não é por culpa sua e sim da máquina pública municipal, cuja ineficiência é bastante conhecida dos munícipes. Sem sair do assunto fiscalização, considere-se, por exemplo, a presença contínua de animais de grande porte, soltos nas vias públicas, incluindo-se estradas e a rodovia federal. O assunto é muito sério, bastando-se dizer que pessoas já apanharam carrapato, ao circular pelo complexo Estação Rodoviária/Praça do Artesão. É uma espécie de carrapato (estrela) que transmite a mortífera febre maculosa. Além de doenças, há o perigo de sérios acidentes rodoviários, que podem ser provocados por manadas de animais (equinos, muares e bovinos), porque a prefeitura não toma nenhuma providência; está, demasiadamente, ocupada em ouvir quem, não tendo o que fazer, senta-se no próprio rabo e bisbilhota a vida alheia.
Aos fofoqueiros de plantão recomenda-se mais cuidado com o uso da língua, não só quanto ao toque, porém quanto à sua função principal, a fala, cuja extrapolação em prejuízo do semelhante pode lhes custar, mais tarde, sérias consequências. Se não têm o que fazer de prático, vão aprender o que não sabem ou ensinar o que sabem; ninguém é tão sábio, que não tenha algo a aprender e ninguém é tão ignorante, que não tenha algo a ensinar. Se isso não lhes convém, vão então rezar ou orar, de acordo com o catecismo religioso de cada um!