O Liberal
Ponto de Vista do Batista
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A jabuticaba II

Nylton Gomes Batista
Para quem teve o privilégio de viver infância e adolescência, em casas com grandes quintais e pomares com boa diversidade de frutas, entre as quais a jabuticaba, provavelmente aqui encontrada pelos primeiros colonizadores, é muito gratificante saber do projeto Pérola Negra a contemplar as “frutas” que, para cachoeirenses tradicionalistas continuam ser as “doces pretinhas”. 
Àquela época, a grande maioria das moradas era simples, piso de terra batida, forro de esteira, destituída de qualquer conforto, incluindo-se a água, presente em apenas algumas residências, em Cachoeira do Campo. Contudo, eram bastante amplas, três ou quatro quartos, dotadas de grandes quintais, nos quais ainda se plantavam hortaliças, ainda que, para isso, água tivesse que ser baldeada de um chafariz público.  Nos quintais, não faltavam bananeiras, mangueiras, laranjeiras, ameixeiras e outras, mas o destaque cabia às jabuticabeiras. Gastava-se o tempo ocioso a escalar árvores, especialmente jabuticabeiras e mangueiras. As mangueiras, por sua característica de galhos estendidos na horizontal, ofereciam, às vezes, pontos de descanso, nos  quais podia-se ruminar pensamentos, enquanto se descansava, quiçá, até dormisse. Ao falar em tempo ocioso, é interessante observar que todas as árvores, ao longo do ano, gastam boa parte do tempo no processo de produção de frutos. Por muito tempo se veem flores a se desenvolver, até a geração de frutos que, por sua vez, crescem por algum até atingir ponto de maturação. Enquanto isso, a jabuticabeira ocupa seu espaço no quintal, sem nada desenvolver e produzir. Nela, além de sua estrutura forte e robusta, coberta por densa camada de folhas miúdas, a se destacar de longe, nada se vê. Nem passarinhos parecem gostar de, nela, nidificar! Dir-se-ia ser árvore, portanto, inútil! 
Em setembro, sob condições climáticas normais, da raiz às grimpas, a jabuticabeira se apresenta como se tomada por brotoejas; toda encaroçada, à semelhança de denúncia de uma intoxicação, e, lá pelo início da última semana do mesmo mês, aqueles milhares ou milhões de carocinhos eclodem e produzem espetáculo, no qual todo o “esqueleto” da jabuticabeira se reveste de um amarelo pálido. De longe tem-se a impressão de ser esponja de nylon, a revestir tronco e galhos! Assim se iniciam os quarenta dias, durante os quais a jabuticabeira cumpre a função de reprodução da espécie, produzindo frutos, que levam em seu interior as sementes daquela árvore. Como recompensa por permitir e facilitar-lhe a existência, a jabuticabeira oferece aos humanos a jabuticaba, frágil e negra frutinha recheada de um néctar, espécie de proteção temporária da semente ou sementes, ali presentes.
Como o processo de deterioração da fruta se processa muito rápido, a melhor maneira de consumi-la é diretamente na jabuticabeira. Para isso, é melhor vestir uma roupa velha e subir na árvore sem preocupação com a sujeira. As frutas crescem em meio às milhões de flores secas, que formam uma grande massa marrom. Quando o tempo está chuvoso, o incômodo se torna maior, mas, em compensação é quando a jabuticaba está melhor. Quem escala uma jabuticabeira, para colher jabuticabas, tem que se integrar com a árvore, sentir-se quase um galho dela. Só assim, pode-se melhor sentir o prazer de destacar a fruta e levá-la diretamente à boca, mesmo que contenha algum cisco. Assim como as frutas são vendidas para os atravessadores que as apanham para vender nas ruas, há proprietários que as vendem para os que se dispõem a saboreá-las diretamente no pé. Combina-se o preço e o comprador se farta da fruta, sem direito de carregar para fora dali. Consome-se o que aguenta e pronto. Quem não se dispõe ao incômodo de subir na árvore, sujar-se, arranhar-se e correr o risco de uma queda, não tem o direito da escolha das maiores, das mais doces, das mais brilhantes. 
Pode-se chupar cinco litros ou mais de jabuticaba e ficar plenamente satisfeito, mas uma hora depois, outro tanto é plenamente consumido pela mesma pessoa. Pessoas com tendência a prisão de ventre devem ter certo cuidado ao chupar jabuticabas. Quem engole os caroços (sementes) crê que o ressecamento intestinal é causado por eles, mas, na verdade, deve-se o “entupimento” ao fato de o suco da fruta funcionar como secante. Portanto, o desconforto não é provocado pelos caroços. Estes apenas agravam a situação. O ideal é ingerir fibras.  Aos que têm o problema, aconselha-se mastigar e engolir algumas cascas da própria jabuticaba e não engolir caroços.

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