Reportagem: Lucas Porfírio
Em Cachoeira do Campo, distrito de Ouro Preto, o nome DJ Kadaver transcende gerações. Nascido Jorge de Castro Ribeiro, em 1953, ele cresceu em uma família musical, absorvendo desde cedo a essência dos ritmos e melodias que viriam embalar sua trajetória. Seu pai, músico da banda Euterpe Cachoeirense, foi a primeira inspiração. Mas Jorge escolheu seu próprio caminho. “Eu tentei aprender saxofone, até fui incentivado pelo Zé Cicílio, mas percebi que não era a minha praia. Sempre gostei de cantar e tocar bateria. Foi assim que comecei na música em Ouro Preto”, rememora o Kadaver.
Ainda jovem, nos anos 1970, aos 17 anos, Jorge passou a integrar a banda “Os Feios”, ao lado dos irmãos Bretas. O grupo, inspirado pelos Beatles, foi um sucesso regional. “A banda foi um estouro. A gente fazia muitos bailes no XV de Novembro e em Saramenha, e só perdia para os Rebeldes, de Mariana. Lembro de shows na Praça Tiradentes, lotada, antecedendo artistas famosos. Esse carinho do público é o que paga a gente”, relembra com nostalgia o DJ.
O artesão que virou DJ
Paralelamente à música, Jorge se tornou um exímio artesão em pedra-sabão, produzindo peças que viajaram o mundo. “Morei em Ouro Preto uns oito ou nove anos, e te garanto que tenho peças espalhadas por aí, até fora do Brasil”, conta o artesão.
Nos anos 1980, Jorge viu a oportunidade de ampliar sua atuação no mundo da música e fundou a Danceteria 88. O espaço virou febre na região, recebendo pessoas de Ouro Preto, Mariana e Itabirito. “Era pequena, cabiam cerca de 300 pessoas, mas ficava lotada, principalmente aos sábados e domingos. Era uma galerinha bem selecionada, sabe? Eu me orgulhava de ver o movimento que gerava”, recorda Jorge.
O DJ era conhecido por sua capacidade de animar o público com repertórios bem selecionados. “Quem comandava a época dos anos 80 era eu. Sempre toquei músicas boas. Minha paixão sempre foi a velha guarda e os anos 80. Para todo lugar que eu vou, levo meu fone de ouvido, sempre com essas músicas”, rememora Kadaver.
A ascensão e os desafios
Após o sucesso da Danceteria 88, Jorge resolveu dar mais um passo e lançou a Kankasmur, uma casa maior, na antiga Rodima, se tornando a alma das noites da região. “E olha, eu não precisava de cartaz para divulgar. Era tudo de boca. No dia da inauguração, coloquei mil pessoas lá dentro. Deu cinco mil reais, cinco reais por pessoa. Mas o aluguel era muito caro. Minha sorte foi não ter fechado a Danceteria 88. Quando vi que não dava, voltei para a casa antiga”, lembra o DJ.
Apesar dos desafios, Jorge continuou se reinventando. Anos depois, lançou a Nix Danceteria, na sede da banda Euterpe, que também deixou sua marca na região.
Kadaver: o nome que ficou
O apelido que virou sua marca nasceu de uma brincadeira no futebol, mas permaneceu por toda a vida. “Um dia, jogando bola, não estava aguentando porque tinha saído no sábado e chegado de madrugada. Um amigo brincou: ‘Você está jogando igual um cadáver’. Ficou Kadaver, e até hoje é assim. Se você chegar em Cachoeira do Campo e falar que quer falar com o Jorge, você vai ser questionado: Jorge?. Mas se você falar o Kadaver, qualquer um sabe”, explica.
Hoje, aos 71 anos, DJ Kadaver se orgulha da trajetória que construiu: “Já encerrei minha carreira. Não preciso provar mais nada pra ninguém. Meu passado diz quem fui. Só fiz o bem, e me orgulho disso”.
Ainda que as pistas de dança não sejam mais tão frequentes, a memória dos bailes, das danceterias e das noites comandadas por DJ Kadaver permanece viva. Ele simboliza uma época, sendo o maestro que marcou os anos 1980 em Ouro Preto, cuja música ainda ecoa na lembrança daqueles que viveram aquele período.