Imagem: Victória Oliveira / Por: Victória Oliveira
Em entrevista ao nosso jornal, o padre Harley, da Paróquia de Nossa Senhora de Nazaré de Cachoeira do Campo, fala sobre os projetos da Igreja e sua relação com a comunidade
Nesta sexta-feira, 16 de maio, padre Harley de Lima celebra 38 anos de vida. Coincidentemente compartilhamos com alegria esta entrevista especial com ele, um pároco que tem conquistado a comunidade de Cachoeira do Campo, distrito de Ouro Preto e de toda a região. Com serenidade e, ao mesmo tempo, de forma profunda, Padre Harley fala sobre fé, missão e cotidiano. Conversamos não apenas sobre os planos da paróquia para o futuro, com destaque para a Coroação Pontifícia de Nossa Senhora de Nazaré, mas também sobre aspectos pessoais de sua caminhada.
O LIBERAL: Como foi sua trajetória até o sacerdócio? Conte um pouco da sua vida, de onde o senhor veio e como chegou até aqui, à Paróquia de Nossa Senhora de Nazaré.
Padre Harley: Eu me chamo Harley Carlos de Carvalho Lima, sou natural de Cristiano Otoni, aqui em Minas Gerais. Sou mineiro, uai! Desde criança, sempre quis ser padre, sempre. Sempre participei da vida da Igreja, na minha paróquia de origem, eu estava presente nos movimentos, pastorais, grupos de jovens, participava das missas todo final de semana. Isso é fruto também da experiência da minha família, tanto da minha mãe e também da experiência dos meus padrinhos de batismo, que me incentivaram muito. Trabalhei no comércio na cidade vizinha, mas não tinha perdido essa vontade. Em 2010 eu tive oportunidade de fazer a experiência da semana vocacional, fui aprovado e entrei para o seminário.
Posse de Padre Harley, em 2022. Imagem: Arquidiocese de Mariana
Passei pelo processo formativo na Arquidiocese de Mariana, e lá fiquei por 8 anos nos estudos de Filosofia, Teologia e fui ordenado diácono por Dom Geraldo Lyrio Rocha, em fevereiro de 2018. Quando nós entramos éramos 28, saímos em sete. Minha primeira nomeação como diácono foi aqui, na Paróquia Nossa Senhora de Nazaré. Cheguei no dia 4 de março de 2018 para trabalhar com o padre Luiz Roberto, o padre Beto. E no dia 6 de outubro daquele mesmo ano, fui ordenado presbítero por Dom Airton José dos Santos.
Logo após a ordenação, Dom Airton me nomeou vigário paroquial aqui da paróquia. Na época, também estava conosco o padre Glauber, que se recuperava de uma doença. Então, éramos três padres em 2018. Depois disso, fui transferido para Itabirito, para ser vigário do Dom Edmar na Paróquia São Sebastião, onde fiquei por nove meses e, em seguida, assumi como pároco das paróquias de São Caetano, em Monsenhor Horta, e São Sebastião, em Cláudio Manuel. Fiquei lá por dois anos e meio, durante o tempo da pandemia.
Depois desse tempo, Dom Airton me ligou, perguntando se eu aceitava ser pároco da Paróquia Nossa Senhora de Nazaré do Campo. Fiquei muito surpreso! É muito difícil alguém voltar para um lugar onde já esteve, mas como eu não tinha exercido a função de pároco, ele me fez esse convite e aceitei com toda a alegria.
OL: Quando o senhor chega como pároco, o que vem em mente? Quais eram suas ideias, o que queria trazer para a comunidade?
Padre Harley: Quando a gente chega numa paróquia, ela já tem uma história. É como entrar num vagão de trem que já está em movimento.Você faz um caminho que já tá sendo feito, não vem para poder interromper ou para começar. Foram grandes desafios, primeiro pela extensão territorial, são 34 comunidades, muitos distritos e subdistritos, uma população grande. Uma paróquia com um patrimônio de fé enorme, com igrejas, capelas, patrimônio artístico, cultural e histórico, e pároco tem a função zelas, de governar, santificar e ensinar — os três “munus” do ministério.
Eu lembro que no dia 15 de agosto de 2022, quando tomei posse aqui, quando tomei posse, disse em meu agradecimento que, antes, eu era auxiliar, e agora assumia a função de pai e pastor. E que, às vezes, o pastor precisa apontar caminhos diferentes. E é isso que temos feito, caminhando juntos, com os conselhos, que eu valorizo porque fortalecem muito a vida e a organização paroquial. Eu acredito que nós começamos bem, buscamos valorizar também a cultura, resgatar a história local, aquilo que está na memória do povo. Aí nós estamos vivendo desta forma.
OL: E para o senhor, quais são os desafios — como ser humano e como pároco?
Padre Harley: O grande desafio é a convivência. Cada pessoa é diferente, é singular, tem uma história e às vezes a gente tem que ter um modo certo de dizer, porque a palavra pode trazer muito prejuízo, assim como pode engrandecer a convivência. Outro desafio é a questão da autoridade. Não o autoritarismo, mas a autoridade como referência, a referência de quem é padre, quem é o líder espiritual da paróquia.
Padre Harley na cavalgada em honra a Nossa Senhora de Nazaré. Imagem: Paróquia de Nossa Senhora de Nazaré
Então são desafios próprios da convivência do dia a dia, do isolamento que as pessoas às vezes tem tendência de buscar, do egoísmo né, do se sentirem donos das coisas, lidar com isso é sempre um desafio, tanto humano como no sacerdócio. Também há os desafios administrativos, de manter as obras da paróquia, cuidar das comunidades,fazer com que as coisas estejam a serviço da fé. E nós nós fazemos muitas obras graças aos dizimistas e benfeitores, muitas obras mesmo. Mas vale a pena, eu sou muito feliz sendo padre, é minha vocação, graças a Deus.
OL: O senhor sente reconhecimento da comunidade? Como enxerga a relação com os fiéis daqui?
Padre Harley: As pessoas dessa comunidade paroquial são muito próximas, nós somos muito do interior, temos esse jeito próximo né?! A gente brinca, conversa, às vezes fecha a cara, fala um pouco mais sério, então isso cria proximidade. Eu me sinto muito acolhido aqui e busco também fazer com que as pessoas se sintam acolhidas na casa de Deus. Não só nas missas, nos velórios, nas visitas aos enfermos, nas casas, nos aniversários… Saber o nome das pessoas, conhecer suas famílias, fortalecer os grupos e as pastorais, isso tudo ajuda na proximidade. Eu me sinto muito acolhido e tento acolher a todos como pastor da paróquia, líder dessa comunidade de fé.
OL: Bom, e falando nisso, houve alguma iniciativa recente que tenha mobilizado a fé da comunidade de forma mais intensa?
Padre Harley: Todas as nossas festas têm sido muito bem participadas. Mas, nos últimos anos, o que mais escuto é sobre a Missa Penitencial das sextas-feiras da Quaresma, às 5h da manhã. E traz um número muito grande de pessoas! Sempre digo que essa missa precisa fortalecer a participação na missa dominical. E, graças a Deus, nossas missas de domingo são muito bem participadas, com um número expressivo de fiéis.
E como o senhor vê a participação dos jovens? E também a relação com as redes sociais, que atravessa a nossa geração?
Desde que cheguei, criamos o EAC — Encontro de Adolescentes com Cristo. Este ano será a terceira edição, ele acontece em dois dias, sábado e domingo, lá no CAIC. E são dois dias que os adolescentes têm a oportunidade de fazer um encontro profundo com Jesus, através de palestras, orações, momentos de partilha, conversa, bate-papo. É um encontro muito profundo mesmo. Depois, há o pós-encontro, em que os adolescentes se reúnem duas vezes por mês. Fruto dos dois últimos EAC’s, hoje temos quase 60 adolescentes participando. E já estava programando nosso próximo encontro em julho, onde já temos 70 inscritos e fila de espera grande. Trabalhamos temas como sacralidade do corpo, sexualidade, fé, vida, redes sociais e agora inteligência artificial.
Sobre as redes sociais, criamos uma pequena equipe para cuidar do Instagram da paróquia, uma possível Pastoral da Comunicação. As pessoas estão conectadas. Se eu não me engano, parece que tem mais de 3 mil seguidores. E as publicações que são feitas pelos membros da equipe são voluntários, são muito bem feitas e com muito bom gosto.diferença é que nós saímos da era do papel. Já não se faz mais programação de festas no papel, agora é tudo Instagram. E isso a gente consegue pensar um pouco na responsabilidade com a casa comum, a ecologia. Pensar um pouco naquilo que o próprio Papa Francisco falava muito em relação ao meio ambiente.
OL: E para 2025, quais são os planos e iniciativas?
Padre Harley: Estamos dando continuidade às reformas das capelas e igrejas. Na Vila Alegre, estamos tentando transformar o espaço celebrativo em uma igreja, acolhedora, agradável, para que as pessoas possam rezar. Também seguimos com o restauro de imagens e de elementos artísticos, a preservação do nosso patrimônio de fé.
Imagem: Paróquia de Nossa Senhora de Nazaré
Agora, naquilo que refere-se à fé, é o grande pedido que fizemos à Sé Apostólica para a concessão da Coroação Pontifícia. Estamos aguardando a resposta do Dicastério para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos. Caso o pedido seja aceito, Nossa Senhora de Nazaré será coroada pelo Papa Leão XIV, por meio de um delegado, e a devoção será reconhecida no mundo inteiro. A devoção presente aqui em Cachoeiro do Campo vai ser reconhecida com esse ato no mundo inteiro. É o nosso projeto, o nosso propósito. Já enviamos a documentação e agora estamos aguardando a resposta e rezando para que seja positiva.
OL: O senhor está ansioso?
Padre Harley: Eu? Ah, não, não. Não, acho que vai sair sim.
OL: Está confiante?
Padre Harley: Ah, sim. Trabalhamos tanto. Fizemos um documento de quase 600 páginas, então, agora é aguardar.
OL: O senhor acabou de mencionar o Papa Leão XIV. A chegada de um novo pontífice impacta toda a comunidade católica. Quais são as suas expectativas em relação ao novo pontificado? E de que forma acredita que essa liderança pode impactar a Igreja?
Padre Harley: Sempre há uma continuidade na descontinuidade. É sempre difícil, porque é muito recente ainda, estamos muito recentes ao pontificado do Papa Francisco. Querer que ele seja igual. não vai ser, mas é uma continuidade na descontinuidade. Como na máxima de Santo Agostinho: “No essencial, a unidade; no secundário, a liberdade.” Isso é algo importante para a vida da Igreja. Santo Agostinho disse isso, e ele é um seguidor de Santo Agostinho. Naquilo que é essencial na doutrina da fé, não pode mudar. Agora, aquilo que é secundário, há liberdade também, para poder conduzir de acordo com a necessidade da Igreja no tempo atual. Porque as coisas mudam, né?
OL: O próprio nome, quando ele pensou no Leão XIII, na questão da Rerum Novarum em resposta a um cenário, e agora é esse contexto da inteligência artificial. Eu tenho muita esperança no Papa, com certeza, é um enviado de Deus, e vai dar muito certo. É um Igreja sinodal, de criar pontes, como ele mesmo disse. Uma Igreja desarmada e desarmante. Uma paz que a gente precisa.
Padre Harley: A gente sabe que sua vida está profundamente integrada com a vida da Igreja. Mas o senhor pode compartilhar um pouco sobre seus hábitos pessoais? O que gosta de fazer?
Eu gosto muito de ler, leio bastante. Eu faço o curso de inglês, porque é preciso. Eu gosto de estudar, rever algumas coisas, rever algumas línguas que eu aprendi, como o latim. Também faço atividade física. Eu acho que é importante cuidar, tem que ter atividade física. No dia de folga, eu procuro tirar a folga mesmo: sair, passear, visitar a minha família A proximidade com a família é necessária também, família é a raiz. E a gente tem que estar próximo, senão perde o sentido. E trabalhar bastante aqui na paróquia, as missas, os atendimentos, as confissões, as visitas e tudo mais.
OL: Por fim, uma mensagem para os fiéis que, por algum motivo, se afastaram da Igreja. Que palavras o senhor deixaria como convite ou reflexão?
Padre Harley: Coragem! Deus não se engana e não nos engana. Coragem. Às vezes os motivos que afastam as pessoas são secundários, pequenos, que podem ser superados. A experiência do amor é muito maior e a gente tem que ter essa experiência profunda para oferecer. A gente não oferece aquilo que não tem. Quanto mais me sinto amado, mais consigo amar. Quanto mais me sinto perdoado, mais consigo perdoar. Colocar o sentido da vida em Deus e viver a fé católica. A fé católica a gente não vive sozinho em casa, isolado na montanha, a gente vive em comunidade. Então tem que superar e retornar, fazer o caminho da fé junto com a comunidade. É um caminho de coragem, de decisão. Amor é decisão!
OL: E que mensagem o senhor gostaria de deixar para a comunidade de Cachoeira do Campo, que tanto admira o trabalho que tem sido feito?
Padre Harley: Só agradecimento. Nós não estamos sozinhos, eu não caminho sozinho. Eu caminho junto com as pessoas. No meio dos membros da paróquia, nós somos mais. A gente forma uma verdadeira comunidade de fé. Isso é muito bom. Então, só tenho a agradecer pela proximidade e pelo carinho que eles têm por mim, como eu tenho por eles. Eu sou muito devoto à Nossa Senhora. Eu amo Nossa Senhora e tenho ela como uma grande mãe. E acredito que é ela que nos fortalece, na fé e no amor.