*Jornalista
É saudável que a campanha eleitoral que já avança em Ouro Preto possa responder à pergunta: qual é a Ouro Preto que se deseja para daqui a dez anos? A pergunta, aparentemente comum, encerra uma série de importantes questões. Na verdade, trata-se de uma discussão essencial, senão vital, para a velha cidade colonial, Patrimônio Cultural da Humanidade, ícone de toda a história da proteção ao patrimônio cultural brasileiro e que encontra-se em momento crucial quando completa 322 anos de existência. A esta indagação podem ser acrescentadas outras, correlatas e complementares, que ajudam a explicar melhor o que realmente é preciso saber e fazer para planejar o futuro desejável, exercício fundamental para uma idade da importância de Ouro Preto.
Nos nossos dias, quais as vocações e tendências que condicionam o futuro ouropretano? Será um destino turístico forte, cultural e de eventos, amparado numa cadeia econômica forte, qualificada, trabalhando conforme modernos e concorrenciais padrões de qualidade? E será também um centro universitário, a julgar pela veloz expansão da UFOP e que se faz sem avaliação da capacidade de acomodação urbana ou da disponibilidade de serviços públicos? E a mineração e suas barragens, seu impacto ambiental e o royalty que paga ao município? Como usar o royalty, que agora é 3,5% sobre a venda bruta, dobrado portanto, para investir em atividades substitutas da mineração? E como vão conviver moradores e estudantes e suas “repúblicas” localizadas no centro histórico e os turistas, em fluxo cada vez maior? E como melhorar a condição de habitação das populações mais pobres, que hoje ocupam os morros de Ouro Preto:
Eis a indagação básica, ou a perplexidade fundamental, neste momento em que Ouro Preto renova sua gestão municipal, em que o mundo entra em crise, da qual poderá surgir um novo ciclo econômico, em que o turismo deverá crescer e em que se acumulam fatores de agravamento da infra-estrutura urbana: qual o elenco de medidas possíveis de ser encaminhadas desde já, bem elaboradas e realistas, que pode ser discutido e gerar apoiadores nas diversas instâncias governamentais?
Admite-se que a cidade melhorou nos últimos anos. E que alguns problemas, embora graves, como também urgentes, podem perfeitamente ser resolvidos, com um pouco mais de determinação e empenho, como a oferta de água, o disciplinamento do trânsito, definição de áreas de estacionamento, melhor qualificação dos fluxos turísticos, normatização de algumas festas perigosas, como o Carnaval, melhor assistência aos distritos. Mas outras questões demandam visão de futuro, ousadia de encaminhamento, planejamento de médio e longo prazo e uma prefeitura ágil, com efetiva governabilidade, capaz de respostas rápidas.
A cidade precisa de um código geral de condutas e posturas, de que temos muitos exemplos em cidades do Brasil e do exterior. E que se aplique não só aos visitantes mas também aos moradores. O Plano Diretor pode ser o instrumento para esta normatização. Mas o fundamental é que haja rigorosa observação destas condutas e severa repreensão aos transgressores. A cidade e sua singularidade justificam o rigor e não há outro meio de se conseguir padrão civilizatório compatível com sua realidade. Fora disto, é correto e certo prever o caos, uma deplorável redução da qualidade da vida e do urbano. O fato é que Ouro Preto acha-se no limite, em vários momentos e ramos, da suportabilidade, conceito que a Organização Mundial de Turismo vem divulgando para todos os destinos, sem o que não haverá sustentabilidade e perenidade.
Ouro Preto preservou-se nos anos finais do Século XVIII com a exaustão do ouro. Permaneceu 100 anos em decadência e imobilismo até que o movimento republicano celebrou Tiradentes e os inconfidentes como heróis e modelos de um novo regime. Com a mudança da capital, em 1897, entrou em novo declínio que durou até a década de 60, com a Alcan e a expansão da mineração regional. Por isto, manteve sua fisionomia colonial-setecentista e esta condição a levou, pela pregação dos modernistas, a ser o ícone de toda a campanha pela proteção dos monumentos culturais brasileiros. Sofreu a expansão urbana desordenada das últimas cinco décadas. Agora encontra-se em um novo limiar, uma encruzilhada: ou impõe a disciplina que a preserve e qualifique, ou caminha para o imprevisível. Manterá apenas um núcleo histórico, cercado de construções sem valor. Será uma outra Olinda. Uma triste e ruinosa Olinda, exemplo maior no Brasil de que um destino turístico não é infinito.