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Carta aos Tempos
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O retorno das ferrovias tem discussão retomada

Em 1986 foi extinta a Rede Ferroviária Nacional. Alegava-se que as ferrovias acumulavam prejuízos por serem deficitárias, vítimas de má gestão e de corrupção e que o transporte rodoviário, de cargas e passageiros, era mais competitivo, mais barato, mais moderno e beneficiaria extensão territorial bem maior. Hoje, entre os analistas da questão dos transportes no Brasil, há ampla concordância de que foi um grave erro. Atribui-se ao regime ditatorial este erro, que privilegiou a rodovia. Hoje, o transporte rodoviário é mais caro, as rodovias tem manutenção cara, o trânsito se torna difícil e perigoso em rodovias de traçado antigo e o Brasil se revela muito atrasado quanto à existência de ferrovias, especialmente para cargas pesado e de grande porte. Tornou-se uma dificuldade limitadora da expansão e da competitividade da economia brasileira.

Hoje, com várias exceções, limitadas a trechos curto e de caráter turístico, as ferrovias transportam cargas pesadas. Com maior percurso, exceção de maior importância, em Minas Gerais, é a Vitória a Minas, mantida pela Vale, que liga Belo Horizonte a Vitória. Transporta passageiros mas também cargas, produtos da Usiminas e outras indústrias do Vale do Aço, além de minério de ferro e carvão mineral. De resto, as ferrovias mineiras, Estado que já liderou a extensão ferroviária brasileira, desde os tempos de Dom Pedro II, grande entusiasta do setor, destinam-se, majoritariamente, ao transporte de minério de ferro e alguns produtos industriais.

O tema do retorno de algumas ferrovias está em debate em razão dos custos e outras dificuldades do transporte rodoviário de cargas. Ocorre que em Minas a totalidade das ferrovias pertencem hoje à Vale, com três empresas concessionárias: a Ferrovia Centro-Atlântica, a MRS e a VLI, está uma holding de várias outras atividades de suporte às ferrovias. E o debate retorna quanto a Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT) autorizou o retorno de ramal ferroviário ligando Três Rios, na fronteira de Minas com o Rio, passando por Chiador e chegando até Sapucaia. Percurso pequeno, turístico, como os outros trechos de passageiros, Ouro Preto a Mariana e Tiradentes a são João del-Rei.

Em 2019, a Assembleia Legislativa criou a Comissão Extraordinária Pró-Ferrovias Mineiras, presidida pelo deputado João Leite, que elaborou relatório detalhado sobre a “potencialidade do transporte ferroviário de cargas e de passageiros”. Visitou cidades e antigos leitos ferroviários. Discutiu os “ impactos econômicos e sociais” de um retorno de vários trechos ferroviários e a possibilidade de novos investimentos destinado a ampliar a malha ferroviária do Estado. E questionou a questão das concessões. Definiu também como “imperiosa” a necessidade de “combater o descaso com o patrimônio ferroviário de caráter histórico”. Realizou visitas e inspeções, ouviu especialistas, levantou o histórico do transporte sobre trilhos no Brasil e o imenso potencial de Minas Gerais no setor, por sua localização central no mapa brasileiro. Indicou a necessidade de questionar as concessões e suas renovações e recomendou que vários trechos poderiam ser reativados. Entre eles, o retorno da famosa linha que saia de Belo Horizonte, passava por General Carneiro, distrito de Sabará, alcançava Rio Acima, Itabirito, Miguel Burnier, Rodrigo Silva, Engenheiro Correia, Ouro Preto e Mariana. Trecho turístico e que poderia também realizar o transporte de carga, até o famoso entroncamento com o antigo centro ferroviário de Miguel Burnier, ainda em operação, que liga Minas com portos do Espírito Santo e Rio.

O leito desta antiga ferrovia, cujo trajeto final, de Burnier até Ouro Preto, foi inaugurado por Dom Pedro II em 1889, ainda se mantém íntegro em sua quase totalidade. Inclusive várias estações e pátios ferroviários, históricos. Mas o fato principal, a justificar seu retorno, é que o ramal ferroviário poderia desafogar a BR-356, hoje congestionada, situação agravada pelos caminhões pesados que transportam minério de ferro, em volume que está aumentando dia a dia, com a abertura de novas minerações nas cercanias de Itabirito e Ouro Preto. Serviria também como trem turístico, atendendo Itabirito, Ouro Preto, Mariana e vários distritos, com seus atrativos cultural, turísticos e naturais ampliados para visitantes, em demanda crescente. Seu retorno seria uma grande conquista para Minas Gerais e para extensa região, considerada hoje a mais atrativa de toda Minas Gerais. A vale, concessionária, já consultada pela própria Assembleia Legislativa, não se manifesta. Mas o tema é importante, recorrente e merece discussão ampliada.

*Jornalista (mauro.werkema@gmail.com)

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