Mauro Werkema
Três desconexões, ou descompassos, impedem o funcionamento regular e produtivo dos poderes da república: o presidencialismo de cooptação, o sistema eleitoral proporcional e o aumento, facilitado, de partidos políticos sem densidade programática ou ideológica que lhes permita orientar-se e ter identidade. E, cima de tudo isto, temos uma classe política cada vez mais aplicada em seus próprios interesses ou negócios e em obter vantagens. O resultado desta situação é a paralisação do próprio Congresso e que, segundo críticos e analistas, limitado por seuis interesses e conflitos enquanto muitas são as pautas de interesse nacional não analisadas, propostas ou votadas. E esta situação torna difícil também o desempenho do Executivo.
A questão mais grave é que os parlamentares, aproveitando-se de um Poder Executivo sem maioria no Congresso, passaram a legislar em causa própria, como mostram as emendas de parlamentares e de suas bancadas à Lei Orçamentária da União, de execução obrigatória, que distribuem recursos diretamente as suas bases eleitorais. E, assim, cada deputado ou senador tornou-se ordenador de despesas orçamentárias dos recursos da União, através de emendas às suas regiões. E, como estamos assistindo, paralisam o Congresso se o Poder Executivo não liberar os recursos. É o que os move, mesmo acima das guerras ideológicas e além da existência de matérias importantes e urgentes a espera de votações.
E o montante, neste 2025, já se situa entre R$ 55 bilhões e R$ 60 bilhões, para obras e outras despesas nos domicílios eleitorais, sem maior análise da boa aplicação do dinheiro público e, como já sobejamente denunciado, sem atender, muitas vezes, ao interesse público. E sem rastreabilidade ou maiores justificativas quando à oportunidade e adequabilidade do uso do dinheiro público. E, o que é também grave, sem atender às metas, objetivos e prioridades definidas pelo interesse público e contidas na Lei Orçamentaria Anual, votado pelo próprio Congresso. E assim, o parlamentar tornou-se um ordenador de despesas do Orçamento Público.
Tal conduta tem consequências danosas, mas a principal delas é que gera, na realidade atual, conflitos e divergências entre os três poderes da República. O Poder Judiciário, pelo Supremo Tribunal Federal, tenta impor normas e exigir transparência, em claro conflito com as condutas do Legislativo. E o Poder Executivo, sem maioria na Câmara e no Senado, obriga-se a conceder as emendas para obter votações. E, a cada necessidade, de votação ou aprovação de medidas, mesmo as de claro interesse público, obriga-se a liberar mais emendas. Estabelece-se um jogo de disputas, de favores, de compra de posições. E perde o Brasil que tanto precisa de ações, decisões e ações governamentais para nossos inúmeros problemas.
Nesta realidade ocorre que o STF legisla, o Parlamento tem ações do Executivo e o Governo se vê limitado na sua execução orçamentária e obrigado a negociar, com crescentes favores, via emendas, para obter votações no Congresso. E agravam-se os conflitos de competência. Amplia-se o que se tem chamado de “presidencialismo de coalisão, ou de cooptação”, sustentado por um sistema eleitoral no regime proporcional e pela criação de partidos sem conteúdo doutrinário ou programas, transformados concretamente em agremiações de negócios, em que as emendas parlamentares, o que é mais grave, acabam por garantir reeleições.
É imensa a lista de matérias que precisam de votação do Congresso que se omite. Não bastasse a disputa ideológica que também divide e paralisa o país. A oposição, majoritária, impede avanços com olhos na disputa eleitoral de 2026. E os partidos, imersos na sua sobrevivência e nos ganhos de recursos orçamentários, também vivem movimentações que refletem sua insustentabilidade ideológica ou programática. O Brasil chegou a ter 35 partidos e hoje tem 17, com as movimentações em curso. O caso mais claro é o declínio do PSDB, outrora importante, hoje com apenas 13 parlamentares e que não sabe se, nas eleições de 2016, elegerá número mínimo para sobreviver.
Esta fragmentação partidária bem revela o que é hoje o Congresso Nacional e explica suas condutas. Luta pelas emendas, comporta-se no espectro binário de oposição e governo, não aprofunda debates sobre matérias de interesse nacional, paralisa-se no debate ideológico, não vota reformas essenciais para administração pública, ou para a economia, demonstrando uma dispersão partidária que trata prioritariamente na reeleição.
E aprofunda-se o conflito ideológico. Basta lembrar que os partidos conservadores, da direita ideológica, são metade da Câmara dos Deputados: são 109 da federação União-PP, 99 do PL e 40 do Republicanos, representando 47% das 523 vagas. E o chamado Centrão, fisiológico, embora com ministros no governo, vota conforme interesses próprios, nem sempre republicanos. Enfim, o governo, para obter votações, é obrigado a realizar composições e liberar emendas. Esta é a nossa realidade política, muito distante dos verdadeiros interesses nacionais.