Entre as muitas questões que os desastres de Mariana e Brumadinho vão demostrando, ou aclarando de forma muito enfática, está à relativa ao “lucro ético”, conceito que se tornou estratégico para a moderna empresariedade. E esta questão expõe, de maneira muito transparente, o drama social e econômico da mineração em Minas Gerais e como vem sendo operada. Na verdade, está no cerne de toda a discussão que se impõe para se evitar novos desastres e para fazer com que a importante atividade mineratória não só seja uma ameaça de vida e morte para milhares de pessoas mas também uma efetiva geradora de benefícios socioeconômicos para municípios e o próprio Estado de Minas Gerais.
E que, afinal, Minas possa quebrar seu histórico ciclo de sucessivas espoliações de sua maior riqueza, herança do seu rico sobsolo. Com o ouro e o diamante, nos séculos XVIII e XIX e o minério de ferro, entre outros minerais, no Século XX, concordam os economistas e historiadores que Minas Gerais deveria ter alcançado um estágio maior de desenvolvimento econômico e social. Estes dois trágicos episódios revelam que seria hora de romper estes ciclos se as elites mineiras, políticas, governamentais e empresariais tivessem realmente vontade e firmeza para começar a impor novas regras à atividade.
Empresariedade e ética integram compõem o conceito contemporâneo do “justo lucro”, o que não se pode fazer a qualquer preço, com sacrifício de vidas humanas e deterioração do meio ambiente. O conceito de Adam Smith da “mão invisível” capaz, no capitalismo selvagem, de promover a justiça social, necessita da “mão visível” da responsabilidade social, essencial para quaisquer atividades empresariais, públicas ou privadas. A busca desenfreada do lucro precisa vir acompanhada de compromissos e preocupações com a cidadania e a elevação da vida das comunidades, em questões como educação, saúde, emprego, respeito ao meio ambiente, cultura. Impõe-se, modernamente, o conceito de “cidadania corporativa”, essencial até mesmo à sobrevivência empresarial.
A empresa válida é uma virada estratégica dos negócios e se torna um conceito que se amplia na sociedade que se forma no mundo renovado pelo humanismo, pela globalização e a comunicação, fatores coadjuvantes da competitividade empresarial. E que vai muito além do lucro a qualquer custo. A mineração predatória, que fica notória no caso da Vale, se torna insustentável. Mas é da responsabilidade dos mineiros interromper estes ciclos espoliativos e impor reajustes e rupturas à exploração de sua principal riqueza, impondo-lhe a dimensão social do desenvolvimento. É inadmissível o imobilismo e a complacência que, como é previsível, nos levarão a novos desastres. É com esta nova dimensão da cidadania, que passa pela empresariedade e seu ampliado conceito contemporâneo, que devemos enfrentar os desafios de rever a mineração em Minas Gerais. Fora disto, nada teremos aprendido com os desastres.
*Jornalista e historiador (mwerkema@uol.com.br)