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A Salvação (conto) – Final

A partir daquele dia, a alta sociedade da imponente Vila Rica passou a se escandalizar todas as tardes, com a visão da duquesa em suas roupas da corte, passeando de braços dados com uma jovem negra, igualmente vestida, com os negros cabelos presos em um coque e uma altivez digna de qualquer dama da cidade. 
Escandalizavam-se e calavam-se. Não mais mudavam de calçada quando Rosa passava, bem-vestida e penteada, de braços dados com sua madrinha ou sozinha, pelas ruas e becos da cidade. 
A jovem, com um sorriso de pura felicidade, fazia questão de cumprimentar a todos, inclusive as mucamas, com a mesma reverência com que fora saudada um dia, pelo jovem Roberto, na matriz do Pilar.
Ela estava inserida na realidade daquela cidade, como se ali tivesse vivido a vida inteira, e a duquesa se transformara na mãe que ela nunca tivera, dando-lhe todo o amor e apoio de que uma filha necessita.
A duquesa, por sua vez, encontrou em Rosa uma filha dedicada e amorosa, com a qual aprendeu valores que sua vida de dama da sociedade não havia lhe permitido conhecer.
O tratamento com os serviçais mudou radicalmente, e ela passou a enxerga-los como colaboradores merecedores de seu respeito e não simples objetos de trabalho, como muitas de suas amigas os consideravam.
Aquelas duas pessoas de origem e educação tão diferentes passaram a trocar experiências de vida, uma ajudando a outra, desenvolvendo suas qualidades e dividindo-as entre si, crescendo espiritualmente e descobrindo o verdadeiro valor da vida.
A duquesa voltou a frequentar a missa aos domingos, e ela e Rosa eram sempre as primeiras a chegar. Entravam e se assentavam no primeiro banco, ao lado das mesmas famílias que, meses atrás, evitavam a moça. Muitas destas famílias ainda estranhavam a situação, mas já não tinham coragem de falar nada nem mudar de lugar, não queriam se indispor com a duquesa.
Rosa não guardava mágoa. Em seu coração não havia lugar para este sentimento. Alma não tem cor ou vestes e era com a alma que ela enxergava as pessoas.
Assim, aquelas duas almas se encontraram. Uma duquesa de pele alva e grande fortuna, que sempre ali morou, e uma ex escrava de pele negra, que chegou àquela terra com apenas uma trouxa de roupas surradas e uma moeda de prata. Através da salvação do filho da duquesa, ensinaram uma lição que permaneceria até o fim dos tempos naquela cidade. Os que se escandalizavam e se calavam jamais entenderiam. Mas quem precisa deles?
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