A cidade é viva

Por Valdete Braga
Quando vejo tantas propagandas sobre Ouro Preto, sinto-me dividida. Amo demais a minha cidade e, culturalmente, ela faz jus às divulgações. Festivais e shows, promovidos pelo poder público ou pela UFOP, estão sempre na mídia e são motivo de orgulho a todos nós, ouropretanos por nascimento ou opção.
Porém, não podemos nos esquecer de que a cidade é viva e possui os problemas inerentes a toda cidade viva. Não somos uma vitrine para turistas ou um quadro na parede. Somos pessoas vivas como a própria cidade e dela sobrevivemos, assim como a fazemos sobreviver.
Somos um todo: centro e periferia, sede e distritos. Ouro Preto não se resume aos palcos montados na Praça Tiradentes ou às palestras no Centro de Convenções. Turistas são muito bem-vindos, mas não são a única razão para existirmos, como alguns parecem pensar. Os casarões dos quais tiram fotos abrigam famílias e os museus visitados possuem trabalhadores, que habitam, em sua maioria, as periferias que eles desconhecem.
Ouro Preto vive, além dos shows, palestras e festivais. Estes devem ser parte desta vida e não o motivo dela.
Preto tem gente. Gente que merece viver em uma cidade conhecida pela cultura, mas que também merece ir para o trabalho e voltar para casa em um transporte público de qualidade, que merece morar em ruas bem iluminadas, que merece transitar pelas ruas em segurança, sem medo de assaltos ou agressões. Ah, o povo ouropretano merece tanto mais além das manifestações culturais…. ele não vive só para isto nem tampouco faz da cidade apenas isto.
Merecemos muito mais do que o turista vê, porque o turista não mora aqui, não vive aqui, e não participa do dia a dia da cidade. Visitantes ajudam na sobrevivência dela, claro, e devem ser muito bem-vindos e bem tratados por todos nós. O que não pode acontecer é vivermos apenas em função do que “eles” gostam e das divulgações pela mídia. Ouro Preto é muito mais do que isto, nós somos mais do que isto.
Temos o centro histórico propagado pelo mundo inteiro como cidade monumento mundial, e temos problemas sérios de moradia entre a população carente.
Temos artistas mundialmente conhecidos, e temos jovens estudantes de artes lutando seriamente por um lugar ao sol. Temos obras arquitetônicas invejáveis e temos construções correndo risco em áreas condenadas.
Como toda cidade viva, temos contrastes. Temos problemas, e os temos por que não somos um cartão de visitas, por mais que sejamos vistos assim por quem não nos conhece. Somente quem aqui vive e realmente ama esta terra compreende o seu todo. Este todo é que nos faz tão especiais e nos torna fortes para enfrentarmos os problemas e seguirmos firmes na preservação desta cidade que é de todos nós.