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Ponto de Vista do Batista
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Rua Santo Antônio V

Por Nylton Batista
Como já se falou, enxurradas e bois que desciam pelo Tombadouro acabavam por desembocar na Rua Santo Antônio e percorrê-la em toda sua extensão. As enxurradas iam engrossar o Maracujá, ainda merecedor da classificação “rio” devido ao seu bom volume; quanto às boiadas, estas alcançavam a “Garagem” (hoje, Praça Coronel Ramos) e daí seguiam seu destino. Mas, bois não passavam pela Santo Antônio somente sob a forma de grandes ou pequenas manadas, que eram conduzidas por boiadeiros para outras paragens.
Por volta das quatro ou cinco cinco horas, plena madrugada, já se ouvia o nheeeeeé… nheeeeeé… nheeeeeé… dos carros-de-bois, no rumo das respectivas roças. À tarde eles estavam de volta. Assim como muitos conhecem o veículo e até o ano de fabricação só pelo ronco do motor, àquela época havia também os que diziam conhecer o carro (qual proprietário) só pelo “cantar”. Afora isso, o carro-de-bois era muito visto nas ruas de Cachoeira, mas era na Rua Santo Antônio que se conheciam os bois bons de tração e carreiros bons de serviço. Dificuldades havia em todos os lugares. O início da rua, hoje São José, por exemplo, era um atoleiro crônico. Em raras ocasiões, um carro-de-bois podia por ali passar!  A diferença estava nos degraus ou calçadas, que em outros pontos não havia. Para subir, os bois tinham que puxar, e muito, cabendo ao guia e carreiro orientar os animais a direcionarem as rodas para pontos certos, evitando pedras mal colocadas que poderiam deixá-los em sérias dificuldades. Para descer, os cuidados não eram menores e conforme as circunstâncias, uma ou duas juntas de bois eram atreladas na traseira do carro. Em tal posição, os bois ajudavam na frenagem e reduziam o peso que caia sobre os bois dianteiros. Vencer cada calçada daquelas não era tarefa das mais fáceis; por isso também a Rua Santo Antônio era muito especial.
Para nós, garotos, que torcíamos para os bois e seus condutores, era uma conquista também! Aqule ôooi…ôooi…ôooi… ôi Marmelo! – no controle dos bichos – nos fascinava. Veja-se que nome de moderna operadora de telefonia era freio de boi! E o que mais transportavam carros-de-bois pelas ruas de Cachoeira? Lenha! Paus de lenha da altura da árvore ou do galho cortado, tudo enegrecido pela queimada proposital. Imagino a cara de ambientalistas, que fazem escarcéu dos diabos devido a fogo em capim rasteiro, ao ler estas linhas. -Isso é um crime! – devem vociferar. Ainda bem que dizem o verbo no presente porque, de fato, hoje é crime, mas àquela época era uma necessidade premente. Tão somente a lenha seca, encontrada e carregada por lenheiras e lenheiros, não era suficiente para abastecer toda a população. Portanto, naquela época, o sacrifício de matas era justificável, sim, e não se discute. Se não pela queima de lenha, como cozer os alimentos? Ainda não havia a alternativa do gás de cozinha! Mas, chegará o dia em que as gerações atuais também serão criticadas pela queima do gás de cozinha. Tudo em seu tempo!
Dentre os animais mais próximos falou-se, até aqui, de bois, de boiadas e dos bois de carro, mas não se pode esquecer dos equinos e muares, que também tinham a Rua Santo Antônio como caminho, depois de percorrido o Tombadouro. Se havia grandes e pequenas boiadas, também havia grandes e pequena tropas de burros. Ao contrário dos bois e vacas, impetuosos, atropelando-se mutuamente, rua abaixo, razão pela qual se aconselhava a que todos os moradores da rua ficassem dentro de casa, as tropas de burros eram calmas, os animais rigorosamente em fila, marcha sem pressa e cuidadosa. Segundo alguns do ramo, dez burros (incluindo-se mulas) formavam um lote e também uma tropa; daí, o tamanho de uma tropa podia variar, de um, dois, três ou mais lotes. À frente, como guia da tropa, vinha a mula madrinha toda enfeitada de fitas coloridas. Ela trazia também um peitoral com sincerros, cujo som servia tanto para anunciar a passagem da tropa, quanto para manter os animais reunidos nos pousos ou no pasto. Curioso é que, assim como as boiadas, as tropas sempre desciam e nunca subiam a Rua Santo Antônio. Não me perguntem de onde vinham e para onde iam, poque não sei responder. Essas tropas transportavam, dentro deste estado e deste para outro estado, praticamente, de tudo de que se necessitava. Os boiadeiros, devido à natureza do trabalho, não passavam de um simples aceno a alguma pessoa na janela, mas os tropeiros, ao contrário, costumavam trocar um dedo de prosa. Eram pessoas simples, porém muito educadas e respeitosas. Se encontravam algum objeto – brinquedo, por exemplo – faziam questão de entregar na casa mais próxima. Eles, os tropeiros, foram os precursores dos modernos e decididos caminhoneiros!

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