Nylton Gomes Batista
Era uma vez um escritor; não um desses que, hoje, se escondem atrás de pseudônimos digitais, mas um de carne e osso, munido de papel e ideais, para ele passar. Era um cara que, para ver seu texto publicado, precisava matar um leão por dia, se não, toda uma manada. Recurso técnico pobre e único, configurado na máquina de escrever, o restante eram tralhas comuns e circunstâncias desfavoráveis: contato e correspondência com o editor, envelopes, selos, filas nos Correios e rejeições recebidas em papel timbrado. O tempo era outro. O mundo era outro, e, o escritor, esse visionário de vocação e teimosia a extremo, era um gladiador solitário em busca de leitores.
O mundo girou e gerou mentes de escala superior, para a busca de conhecimento acima do então vigente e mantenedor do isolamento relativo das pessoas. Virou-se, então, a chave da tecnologia, em favor do desenvolvimento, a começar da comunicação. Aí estava o escritor, onde e quando lhe foi apresentado o computador pessoal (PC), ainda meio rudimentar, é verdade, se comparado ao de agora. Entretanto, já não mais gastava papel à-toa, não mais necessária a manobra manual do carro da máquina de escrever, ao término de cada linha; não mais preocupação com erros ortográficos que, no PC, podem ser corrigidos posteriormente (mais tarde viria a correção automática); não mais a escrita de texto, à parte, para ser inserido, em página pronta e a ser, novamente, datilografada, pois o PC permite fazer inserções a qualquer momento e em qualquer ponto do texto; nada de borracha, nada de corretivo de qualquer tipo. Enfim, a gambiarra é banida da escrita com a chegada do PC. O texto pode ser impresso, totalmente, limpo. Se necessárias alterações é só fazê-las, no PC, onde o texto está gravado e reimprimir a página alterada; simples assim.
Para o escritor, acostumado a todo o trabalho anterior e chatices próprias da atividade, a coisa já estava boa demais; mas, outras surpresas ainda viriam. A internet foi a novidade tecnológica, por excelência, que permitiu ao escritor descobrir oportunidades, encontrar ferramentas e outros recursos, nunca sonhados. Sites de pesquisas se instalaram e, paulatinamente, se expandiram, vieram os dicionários online, a livrar escritores de folhear aqueles antigos tijolões, embora alguns os prefiram; uma questão de gosto, que não discute. No editor virtual mais difundida, a minhoquinha vermelha, abaixo de erros ortográficos, é eliminada pela correção automática. Mais algum tempo surge o tradutor online. A princípio, meio capenga, aprimorou-se e, hoje, há editor que o disponibiliza na página, em edição. Depois de ter prontos os originais de um livro, por exemplo, o ponto crucial para o escritor era contratar uma editora. Havia dois caminhos: cair nas graças de uma (coisa quase impossível para iniciantes) ou bancar a edição por conta própria, coisa muito cara e inacessível a muitos escritores iniciantes. Se, antes da internet, no tempo da máquina de escrever, alguém dissesse isso, diriam que estaria no mundo da lua, a imaginar o impossível, ou que estaria tomado pela loucura, mas chegou a vez de o próprio escritor editar seu livro, sem a interferência de terceiros. Sim, há algum tempo, qualquer escritor tem disponível, na internet, recursos que lhe permitem editar sua própria obra. Em poucos instantes, dentro de uma plataforma de edição, o escritor transforma seus originais, em livro, e o disponibiliza para venda. Há mais! O escritor pode ter o livro editado em dois formatos: livro eletrônico, o conhecido e-book, e o tradicional livro impresso, que grande parte do público prefere, para se folhear, ao ser lido, além de tê-lo guardado na estante.
Percebe-se que, na atualidade, com quase nada o escritor tem que se preocupar, além da escrita; ele tem muito mais tempo para ruminar suas ideais e transformá-las em texto. Em comparação com o antigo escritor, que precisava matar um leão por dia, o de hoje mata um camundongo em todo o processo!