A mãe acorda, sonolenta, e se depara com a filha de 20 anos perto da cama, com o aparelho celular virado para ela.
– Bom dia, mãe.
– Bom dia – ela responde. O que você está fazendo?
Com a maior naturalidade, a filha responde:
– Fale alguma coisa para a câmera. Como será seu dia hoje?
A mãe pula da cama, literalmente. O que ainda restava de sono desaparece e ela tira o celular das mãos da filha. Mexe no aparelho, apaga o vídeo em andamento e pergunta o que significa aquilo, nervosa por estar sendo “filmada” ao acordar, de pijama e descabelada. A filha explica que está fazendo um “diário da quarentena” para postar em seu blog, contando o dia a dia da família, neste período.
Nervosa, a mãe pede licença para acabar de se levantar e quando a filha pede o celular antes de sair do quarto, diz para ela esperar na sala, que precisam conversar antes de devolvê-lo. A moça vai para a sala e espera.
Algum tempo depois, elas conversam, a mãe cobra explicações mais detalhadas, e a filha explica que estava preparando um diário virtual, onde iria mostrar para os seus “seguidores” a rotina da família, nesta fase de quarentena. Seria, segundo ela, uma forma de aproximação com as pessoas.
Passado o susto, já calma e com voz tranqüila, a mãe pergunta se ela havia parado para pensar nos membros da família que participariam do vídeo, se havia pedido permissão, se eles concordariam em aparecer, falou do constrangimento que poderia causar neles, fez um verdadeiro discurso e terminou perguntando se ela não acordasse, se a filha publicaria uma imagem dela sem autorização, ao que a moça respondeu que “não havia pensado nisto”.
Esta história retrata bem uma geração que perdeu totalmente o senso de privacidade. Uma moça ou rapaz de vinte anos de idade não são mais crianças. Deveriam ter maturidade para entender que nem todo mundo gosta ou quer esta exposição que virou moda. Filmar uma pessoa e “jogar na rede”, sem permissão, não é normal e nunca será. O simples entrar no quarto de alguém sem autorização já demonstra falta de respeito, mesmo esta pessoa sendo sua mãe, mas para eles tudo isto é natural.
Obviamente, existem exceções, mas a maioria das pessoas, atualmente, perdeu a noção de privacidade e respeito, tanto ao próximo como a si mesmo. A maioria é jovem, mas tem muita gente madura caindo no mesmo erro. Exposição em excesso não é bom para ninguém, nem para quem expõe nem para quem é exposto. Passou da hora das pessoas entenderem isto.