Reza a lenda que, há muitos e muitos anos, havia um jovem viúvo, que tinha um único filho, de cinco anos de idade. Desde que perdera a esposa, o filho era sua única alegria e devotava a ele um amor incondicional.
Certo dia, quando o pai trabalhava no campo, bandidos atacaram e incendiaram a aldeia, levando seu filho como prisioneiro. Os demais habitantes da aldeia não conseguiram fugir e morreram todos queimados.
Do campo, o jovem pai vê a fumaça, e corre de volta à aldeia. Lá chegando, vê tudo destruído e entra em pânico. Vê o corpo carbonizado de uma criança do tamanho e com as características do seu filho e se desespera. Pega o corpo queimado da criança e chora copiosamente.
Desesperado e sofrendo como nunca, organiza a cerimônia de cremação e põe as cinzas num bonito e pequeno saco, que passa a carregar sempre consigo, como uma forma desesperada de manter o filho perto.
Com o passar do tempo, novos aldeões chegam, refazem as casas, e o jovem pai também decide ficar ali, para honrar a memória do amado filho.
Alguns anos se passam e a criança que foi raptada aos cinco anos de idade consegue fugir e, com muita dificuldade, encontra o caminho de volta para casa, ansioso para contar ao pai que conseguiu sobreviver.
Chega à nova casa de seu pai, reconstruída no mesmo local onde fora destruída, e bate à porta. Já é tarde da noite.
O pai, que ainda não superara a dor, pergunta:
– Quem é?
A criança responde:
– Sou eu, pai, abra a porta. Estou ansioso para lhe dar um abraço.
Porém, em seu agitado estado de alma, convencido de que seu filho já estava morto, o pai pensa que algum menino está fazendo alguma brincadeira de mau gosto, para ridicularizá-lo. Ele então grita:
– Vá embora. Respeite a dor de um pai. Nunca mais volte aqui.
A criança, desesperada, insiste, mas o pai, cego de dor, se recusa a abrir a porta e continua gritando para que o menino vá embora.
Depois de algum tempo, a criança desiste e vai embora, também aos prantos. Pai e filho nunca mais se encontraram de novo.
Segundo a lenda, Buda contava esta história aos seus seguidores e a terminava com a seguinte frase: “Às vezes, achamos que alguma coisa é verdadeira e não aceitamos outra possibilidade. Se nos apegamos fortemente a esta “verdade”, mesmo que a verdade bata à nossa porta, não a abriremos”.
Estejamos, pois, abertos a outras possibilidades que não apenas à nossa verdade, pois ela não é única.