Mauro Werkema*
Que mundo é este? Indaga o cidadão consciente do seu tempo neste velho mundo, perplexo com as mudanças, os desentendimentos, as transformações nem sempre boas ou que melhorem as condições de vida em paz. Qualquer olhar mundial que permite uma contemplação universal é naturalmente preocupante embora sejam muitas e revolucionárias as evoluções saudáveis para o conhecimento das próprias sociedades, para a ampliação do diálogo internacional e nos cuidados com a saúde e as condições de vida. É importante lembrar que a passagem para o terceiro milênio foi celebrada em todo o mundo como a chegada de uma nova era, de mais paz e prosperidade, sem repetir as duas grandes guerras do Século Vinte, com maior diálogo e cooperação entre as nações. Mas, infelizmente, um olhar sobre o mundo atual, mesmo sem maior abrangência, não nos torna otimistas.
Comecemos pela ameaça maior: a crise climática, que avança a cada dia, com desastres ambientais já em maior volume e alcances inesperados, culpa do próprio homem, que insiste em explorar a natureza sem cuidar da preservação. As sociedades industriais, as megacidades, o uso indiscriminado das terras, gerando devastações e áreas estéreis, a derrubada das coberturas vegetais, a alteração e o uso poluente dos cursos de rios e lagos, o aumento da temperada do mar com várias e graves consequências, os ambientes estéreis e inóspitos para a própria vida nas grandes concentrações urbanas, a destruição da camada de ozônio que nos protege dos raios solares, tudo isto está a acontecer sob as vistas de todos nós. E são fatos conhecidos, mas não contidos satisfatoriamente até hoje.
E voltam a acontecer, em escaladas ampliadas pela tecnologia destrutiva, de misseis e drones, as guerras entre países, em busca de poder, de ampliação territorial, com cenas e assassinatos coletivos diariamente mostrados pela televisão. O genocídio de Israel em Gaza, que já matou quase 60 mil pessoas não pode ser explicado como defesa de ataque terrorista que, por sua vez responde a outros atos de opressão e domínio territorial. O conflito Rússia-Ucrânia atualiza antigas desavenças e não sabemos onde vai parar, com ameaça até de uso de armas nucleares, uma insanidade perante o mundo civilizado em que armas de tal potencial destrutiva já deveriam estar eliminadas. A ONU, criada nos escombros da Segunda Guerra Mundial, justamente para ser instrumento de diálogo entre as nações, perde sua capacidade de interromper conflitos e impor a paz entre nações.
O mundo ainda convive com bolsões de miséria e doença e não só nos países mais pobres da África, mas também nas periferias das grandes metrópoles, onde vivem as populações desterradas do processo civilizatório, faveladas em condições precárias de vida, de oportunidade de educação, saúde, alimentação e trabalho e renda mínima. São vítimas não só da exclusão social, mas também, como em várias regiões do mundo, de guerras de extermínio, quase sempre entre irmãos de nacionalidade, por divergências ideológicas ou de domínio do poder. E sem acesso às conquistas mínimas da civilização que avançou muito na produção de bens mínimos de qualidade de vida, como a Medicina, a oferta de alimentos e a segurança alimentar, a garantia da vida. A riqueza de alguns constrange a miséria de muitos. E agora, para surpresa universal, a maior nação do mundo, a mais rica, os EUA, parece mergulhar numa nova era desconexa com o próprio percurso de domínio geopolítico e econômico do mundo, com atitudes excludentes e exclusivistas. E já com reações contrárias no seu próprio território, como mostram os protestos contra as prisões e deportação de emigrantes, intervenções em universidades, posturas restritivas ao comércio com antigos parceiros. O que ocorre na Califórnia, região rica dos EUA, com protestos violentos nas ruas, pode escalar para outras regiões. E vemos, a cada dia, que o que acontece neste país tem consequências em todo o mundo e, certamente, reduz a capacidade mundial de buscar, pelo diálogo e entendimento, uma nova ordem geopolítica que privilegie a paz, a cooperação e o enfrentamento conjunto das grandes ameaças que se apresentam no horizonte internacional, no clima, nas guerras, no combate à pobreza, às doenças.
Enfim, avança a perplexidade com relação a este velho mundo. E o ideal de paz e prosperidade se reduz perante esta realidade em que o mundo não avança na cooperação, em busca de um diálogo internacional. Será que a sociedade dos homens, neste século XXI, retrocederá à barbárie, às guerras, à ampliação das carências mínimas para vidas humanas dignas e em convívio harmônico com a natureza? E, cabe indagar, como fica a política, a arte de dirigir as nações, de escolher bons governantes, respeitadores da ordem democrática, trabalhando pelo bem comum, e não por interesses pessoais. E respeitadores dos mandatos, sem aspirações golpistas que querem perpetuar-se no poder, sem a legitimidade do voto popular, afrontando a democracia, regime político que tem na legitima maioria da opinião pública sua autoridade moral maior.
Eis o mundo do nosso tempo. Não mais aquele que a mudança para o terceiro milênio ensejava. E, hoje, sem previsões de que vamos ver um novo tempo de prosperidade harmônica, baseada no diálogo e na cooperação. E, o que é mais surpreendente, a universalização da Internet, sem dúvida maior invenção de toda a história mundial, surge nos nossos dias para o bem e para o mal. E também não sabemos onde vai parar com a Inteligência artificial que já permite manipulações, enganos, falsidades e até usos destrutivos, e cujo percurso só está iniciando.
*Jornalista e historiador ([email protected])