Igreja de Paracatu de Baixo, território atingido pelo rompimento da Barragem de Fundão, em 2015. Imagem: Tomaz Silva/ Agência Brasil
Por: Amanda de Paula Almeida
Relatório divulgado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) apresentou dados alarmantes sobre sonegação da Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM) por parte das mineradoras nos últimos anos. Segundo o documento, entre 2017 e 2023, empresas mineradoras brasileiras deixaram de pagar às cidades mineradoras cerca de R$ 16 bilhões de reais da CFEM. Além disso, entre 2017 e 2021, cerca de outros $ 4 bilhões já caducaram e o prejuízo pode chegar a R$ 20 bilhões referentes a 12.243 processos de cobrança pendentes.
Segundo dados apresentados pela Associação dos Municípios Mineradores (AMIG) de Minas Gerais e do Brasil, a Agência Nacional de Mineração (ANM), autarquia responsável por regulamentar, outorgar e fiscalizar a atividade de mineração no Brasil, vem sofrendo com sucateamento que contribui para a sonegação por parte das mineradoras. Entre as informações mais alarmantes divulgadas, a ANM lida com uma enorme defasagem nos cargos da autarquia, atualmente são somente 4 profissionais para fiscalizar o pagamento de CFEM de quase 40 mil processos minerários.
Além disso, dentre todas as agências reguladoras brasileiras, a ANM apresenta as piores condições para executar seu papel fiscalizador e regulador. Dos 1.728 cargos da autarquia, 1.078 estão vagos. Ademais, há uma defasagem salarial em relação às demais agências reguladoras de 46%. Outros problemas estruturais também foram listados, como: sistemas de tecnologia da informação obsoletos e limitados; falta de equipamentos e acúmulo de funções.
Sucateamento da ANM e o lucro das mineradoras
Enquanto a Agência reguladora precisa atuar lidando com o sucateamento infra estrutural grave, 70% dos títulos minerários não pagaram os royalties devidos. Entre aqueles que pagaram a CFEM, houve uma média de sonegação de 30,5% a 40,2%. Estima-se uma perda entre R$ 9,38 bilhões e R$ 12,35 bilhões para o país. Em 2022, a ANM conseguiu fiscalizar apenas 17 empresas de mineração, mesmo havendo 39.024 processos ativos no país. Entre 2017 e 2021 foram fiscalizados apenas 1,1% de 6.154 processos ativos na fase de concessão de lavra, sem pagamentos da CFEM associadas a eles.
A Vale, empresa que apresentou um lucro histórico em 2021 com R$ 121 bilhões, é a maior sonegadora apresentada no relatório do TCU, acumulando uma dívida de aproximadamente R$ 2,8 bilhões. Em analogia feita pela Agência Pública, a Vale deixou de pagar, em média, em seis anos, R$ 7,6 milhões por dia, mesmo tendo, em 2021, por exemplo, um lucro médio diário de R$ 330 milhões.
E os municípios?
Em relação aos municípios onde ocorre a produção mais prejudicados pela sonegação estão Parauapebas/PA, que receberia cerca de R$ 360 milhões, Ouro Preto/MG, que receberia cerca de R$ 326 milhões, Mariana/MG, que receberia cerca de R$ 262 milhões e Itabira/MG, que receberia cerca de R$ 239 milhões.
Enquanto isso, além da Vale que lidera o ranking das empresas mineradoras que mais se beneficiaram com a sonegação, a empresa Minerações Brasileiras Reunidas S.A., deixou de pagar cerca de R$ 445 milhões, a Cadam S.A. deixou de pagar cerca de R$ 52 milhões, a Mineração Vila Nova Ltda. deixou de pagar cerca de R$ 35 milhões, e a AngloGold Ashanti Córrego do Sítio Mineração S.A., que deixou de pagar cerca de R$ 24 milhões.
Próximos passos
No dia 7 de abril, o Tribunal de Contas da União (TCU) e a Agência Nacional de Mineração (ANM) reuniram-se em Brasília para discutir medidas com o objetivo de aprimorar a governança e a estrutura da ANM, com foco no fortalecimento da mineração como vetor de desenvolvimento econômico e social. O encontro entre o ministro do TCU Augusto Nardes e o diretor-geral da ANM, Mauro Sousa, marcou o início de uma agenda institucional voltada à avaliação do setor mineral no país.
Segundo o diretor-geral Mauro Sousa, a estrutura da agência ainda é limitada para lidar com toda necessidade minerária no país, “Hoje contamos com apenas 30% do quadro ideal de servidores. Um concurso público está em andamento e esperamos contar com 200 novos profissionais até o fim do ano, o que será fundamental para melhorar a fiscalização, a arrecadação e o estímulo à atividade mineraria”, pontuou.
A Associação dos Municípios Mineradores (AMIG) de Minas Gerais e do Brasil – da qual Mariana e Ouro Preto fazem parte – também entrou com uma representação junto ao Ministério Público Federal, na qual exige do órgão providências para o fortalecimento da ANM e para o combate à sonegação.
Segundo a AMIG, apesar da mineração representar de 4% a 5% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, o dinheiro não vai para quem precisa. A AMIG apresentou que, com os R$ 20 bilhões de prejuízo referentes a 12.243 processos de cobrança pendentes, seria possível construir 400 hospitais de médio porte, 5 mil escolas públicas e 6 mil km de estradas pavimentadas: “Os bilhões sonegados poderiam estar em moradia, saneamento, educação, escola em tempo integral, diversificação econômica, saúde. Mas estão aumentando o lucro da iniciativa privada”, declarou o consultor de relações institucionais e econômicas AMIG, Waldir Salvador.