Ano que vem, 2020, Minas Gerais completa 300 anos da criação da Capitania de Minas do Ouro, autônoma e com administração própria, separada da Capitania de São Paulo, que integrava desde 1709. Em 1717, o rei de Portugal, dom João V, nomeou Dom Pedro de Almeida Portugal e Vasconcelos, Conde Assumar, governador geral da Capitania de São Paulo e Minas do Ouro. Assumar instala-se em Mariana, então Vila de Ribeirão do Carmo e ocupa o casarão anexo à Igreja de São Francisco, conhecido como Palácio de Assumar, que começa a ser restaurado após anos de abandono. Assumar trazia como principal missão organizar e disciplinar a cobrança do quinto do ouro, o imposto que Portugal cobrava da Colônia e que teria que ser pago por todos os mineradores que realizavam a extração do ouro.
Assumar encontrou forte resistência dos habitantes quanto à cobrança do imposto. Em 1720, rebelam os moradores de Ribeirão do Carmo (Mariana) e Vila Rica (Ouro Preto), que chegaram a ameaçar Assumar. Refugiado em Vila Rica, o governador armou sua reação, enfrentando os conflitos diversos. O principal deles vitimou Felipe dos Santos, português mas habitante de Minas, minerador e comerciante. Preso em Cachoeira do Campo, foi executado com ordem de Assumar, transformando-se no primeiro mártir mineiro, morto em meio à luta por autonomia. As condições do assassinato de Felipe dos Santos, se em Cachoeira ou Vila Rica, ainda geram controvérsias. Assumar teria também incendiado as encostas da Serra de Ouro Preto, onde trabalhavam e residiam centenas de mineradores, e que passou à história como “Morro da Queimada”.
Os acontecimentos de 1720 levaram o rei de Portugal, dom João V, por solicitação e indicação do conde de Assumar, a criar a Capitania de Minas Gerais, separando-a de São Paulo. Por esta época a Capitania já tinha numerosa população e vários núcleos urbanos, quase todos com ocorrências de rebeliões e conflitos, dos quais o mais famoso, e mais aguerrido, com muitas mortes e combates, foi a Guerra dos Emboabas, entre 1708 e 1709, entre paulistas, pioneiros na ocupação do território das minas, e portugueses e outros emigrantes que acorreram à região em busca do ouro.
Assumar mudou-se para Vila Rica onde instalou-se no Palácio Velho, de que hoje só restam alguns paredões em ruinas, em região que tem esse nome, próximo ao Bairro de Antônio Dias. O Palácio dos Governadores, hoje pertencente à Escola de Minas da UFOP, só foi construído a partir de 1747. Vila Rica tornou-se então a capital da Capitania e o Palácio da Praça Tiradentes sediou os governos mineiros, no regime colonial, até a Independência de 1822, no período imperial até a República proclamada em 1889, e até 1897, quando a capital mudou para Belo Horizonte. Atribui-se ao Conde de Assumar, que permaneceu em Vila Rica por apenas mais um ano, a publicação de um depoimento dominado “Discurso histórico e político sobre a sublevação que nas Minas houve no ano de 1720”. Assumar procura explicar sua conduta, considerada excessiva, dizendo que se viu obrigado a “proceder sumariamente ao castigo”, como a execução de Felipe dos Santos e a prisão de outros sediosos, alguns ricos mineradores e proprietários na região. É documento de elevado valor histórico para a compreensão dos primórdios de Minas Gerais e a gestão colonial portuguesa nos seus primeiros anos.
Em Alvará de 2 de dezembro de 1720, determinado por Dom João V, foi criada a Capitania de Minas Gerais, separada de São Paulo, com governo próprio e autonomia administrativa. A data está confirmada por pesquisa histórica já realizada e que esta ensejando vários programas comemorativos. É também particularmente importante para Ouro Preto, não só por ter sediado os principais acontecimentos relativos à criação da Capitania mas também por ser a primeira capital do Estado. E deve ser comemorada não só pelo Governo do Estado mas pelos Poderes Legislativo e Judiciário, prefeituras, instituições históricas e entidades da sociedade civil. A data enseja também discussão sobre os três séculos da História de Minas, a evolução econômica, social e cultural, dificuldades ao pleno desenvolvimento, a contribuição de Minas à nação brasileira. Como também seria importante para estudo e reflexão sobre as dificuldades por que passa o Estado, embora com rica história e um cobiçado subsolo mineral que gerou a ocupação do seu território e lhe deu o nome. Do Ciclo do Ouro, que se inicia nos anos finais do Século XVII, ao Ciclo do Minério de Ferro, hoje bastante discutível, Minas Gerais tem uma longa trajetória que merece estudo e reflexão. Importante ainda é discutir o futuro desejável e as grandes dificuldades por que passa no momento.
*Jornalista e pesquisador (mwerkema@uol.com.br)