Em terreno elevado, do qual é possível se contemplar grande parte do conjunto urbano de Cachoeira do Campo, em situação privilegiada à margem da BR-356, Rodovia dos Inconfidentes, o magnífico prédio histórico do antigo Colégio Dom Bosco se deteriora. Sem destinação de uso, após polêmica judicial com o Ministério Público Estadual que impediu sua venda a empresa imobiliária, o deteriora o prédio e 520 hectares de terras pertencem à Ordem Salesiana, gerenciada pela Inspetoria Dom Bosco, sediada em Belo Horizonte. Em meio à disputa pela propriedade, vencida pelos salesianos, o IEPHA (Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico) tombou o prédio por seu valor histórico e arquitetônico, determinando sua preservação e destinação de uso cultural ou educacional.
Registros históricos informam que já em 1736 se edificara um quartel para a tropa de cavalaria que se encontrava então na Vila de Ribeirão do Carmo (Mariana) iniciativa do então governador da Capitania, Martinho de Mendonça. Diogo de Vasconcelos (História Antiga das Minas Gerais, volume I, de 1901) diz que “o governador Martinho de Mendonça, vendo que já não era possível manter, por falta de pastagens na Vila do Carmo, o esquadrão de cavalaria, foi a Cachoeira e de seu exame resultou que mandasse edificar o quartel e para lá transferir os cavalos de Sua Majestade”. Diogo de Vasconcelos dá notícia de que “o conde de Valadares, com José Luís de Menezes Abranches, que governou a Capitania de 1768 a 1773, construiu um casarão mais vasto para quartel e cavalariças contendo 40 argolas, a fim de ter de prontidão uma força de dragões ao primeiro aceno”. A criação do “Regimento Regular de Cavalaria de Minas”, tropa paga, se deu pela Ordem Régia de 27 de abril de 1775, obtida pelo governador Dom Antônio de Noronha, que reorganizou as forças militares da Capitania, realizando a fusão de várias companhias isoladas, distribuídas pelo território da Colônia.
O historiador Augusto de Lima, na sua “Crônica Militar”, de 1969, diz que o Regimento instalou-se inicialmente em Vila Rica, no “Quartel do Xavier”, hoje Colégio Dom II na rua das Flores, passando inteiramente a Cachoeira do Campo em 1779, com a conclusão da construção do novo quartel. Em 1816 Dom João VI determinou a criação de cavalos de uso militar. E dom Pedro I, que lá esteve em 1822, incentivou uma coudelaria, de criação de cavalos. Dom Pedro II, que o visitou em 1881, em famosa viagem a Minas, decidiu doar o prédio e terras ao Governo de Minas. O então governador Afonso Penna criou uma Colônia Agrícola, chamada Cesário Alvim, que não durou três anos. Decidiu, então, ceder prédio e terrenos à Ordem Salesiana com o compromisso de manterem instituição educacional. Por 100 anos os salesianos mantiveram o famoso colégio Dom Bosco. Tentaram uma hospedaria, também falida, quando, então, decidiram pela venda, contestada por moradores de Cachoeira do Campo, que criaram o movimento “Dom Bosco é nosso”, e pelo Ministério Público.
Tiradentes, alferes de Cavalaria, pertenceu a este Regimento. Seu comandante foi o tenente-coronel Francisco de Paula Freire de Andrade, também inconfidente.
Em meio à disputa judicial, a Polícia Militar de Minas manifestou interesse em ficar com o quartel. Em seu site institucional, a PM afirma que é a mais antiga do Brasil e informa que sua origem está na criação do Regimento de Cavalaria Regular, em 1775, sediado em Cachoeira do Campo. Também a UFOP manifestou interesse com o objetivo de criar novas unidades de ensino, desafogando Ouro Preto, e manter um laboratório de incubação de projetos industriais a partir das experimentais de suas escolas técnicas. E o Ministério Público pediu, sem conseguir, a devolução de todo o patrimônio ao Governo de Minas, dizendo que a Ordem Salesiana descumpriu a finalidade educacional para a qual recebeu o uso do prédio e terrenos.
O fato é que o prédio histórico, valioso, continua sem manutenção que o preserve, quando poderia ter destinação útil econômica e social para Cachoeira do Campo e região. E os salesianos, por outro lado, não informam o que pensam ou pretendem fazer com a propriedade. Cabe ao IEPHA fiscalizar o prédio para verificar a deterioração do patrimônio tombado. E à Prefeitura de Ouro Preto indagar o que pretendem fazer com o prédio.
*Jornalista (maurowerkema@gmail.com)